Uma História de Natal



Sabe o que é um saco? Não ter um Natal como dos filmes no Brasil. Claro, a gente tem Papai Noel de shopping, as luzes, e é tudo muito supimpa e daora; mas aquele Natalzão com neve, chocolate quente, biscoitos de gengibre, lareira, e reprises anuais de Como o Grinch Roubou o Natal. O desenho, não o filme live action.
E o que temos no lugar? Calor, arroz com passas, salada com maçã/morango, ventilador, e o Especial do Roberto Carlos.

Outra coisa que é um saco é começar um artigo com uma paródia tosquíssima do James Rolfe, mas divago.


Enfim, quando eu vi o Nostalgia Critic falar sobre Christmas Story e dizer que era a representação da infância de todo mundo, eu naturalmente achei que seria algo mais pra eles. E é verdade, tem muita coisa que só eles entenderiam, por viverem nesse contexto. Mas será só isso mesmo?



A Chritstmas Story se passa em algum momento entre 1939 e 1942, e acompanhamos o jovem Ralphie. Ele é um guri normal de 9 anos, e o Natal está próximo, e como todo garoto da sua idade, a única coisa que permeia sua mente é conseguir o presente que quer: uma arma de brinquedo pertencente a um herói de faroeste.




E basicamente o filme segue um slice of life de Ralph, onde vemos vários momentos que precedem o Natal, tais como a redação de fim de ano; a família indo comprar a árvore, a parada de fim de ano, etc. E embora em alguns momentos ele de fato divague muito e foque em outros aspectos, não tira tanto tempo e logo volta ao plot. É só a história de um guri num Natal, mas o que torna esse filme especial, é a forma que ele é narrado.


Assim como Todo Mundo Odeia o Chris, o Ralph crescido narra os acontecimentos aqui. E embora o estilo de comédia seja diferente, funciona lindamente.

Chris usa um estilo que valoriza o timming da piada, há uma preparação, um clímax e uma conclusão, enquanto Ralph simplesmente descreve os acontecimentos de uma forma engraçada, tal qual... Sei lá, o Izzy Nobre.




É engraçado porque ele exagera certas coisas, mas que de fato são coisas que pensamos e sentimos quando crianças, mas talvez não tivéssemos o vocabulário ou habilidades de escrita que temos agora. E ele descreve situações extremamente corriqueiras, como escapar de uma punição, ou decodificar uma mensagem num ARG. Ou quando imaginamos certas situações que são cartunescamente irreais e começamos a sonhar acordados.

Eu mesmo, por algum motivo, imaginava as coisa quase como um desenho animado, quando era criança.

Assim como tinha quase a mesma sensação descrita quando me safava de um castigo.





E é essa narração típica de crônica que faz o filme, e até me assustou. Eu achei que só quem vivenciou esses Natais nos EUA iria se identificar, mas eu me peguei me identificando com várias coisas, mesmo nunca tendo pisado na terra do Tio Sam. E não é coisa tipo "eu conheço porque eu vi nos filmes e nossa cultura acabou absorvendo", é do tipo "eu vivi isso quando era pirralho".

E do nada eu comecei a sentir falta dos Natais antigos. Mas isso é assunto pra outro artigo.





A atenção aos sets também é fantástica, a fotografia captura muito bem as luzes, as decorações, a neve, é tudo muito lindo. Eu acho fantástico também como alguns momentos eles tentam nos botar na pele de Ralph, em especial quando eles vão ver o Papai Noel. Usam a câmera em primeira pessoa, que evoca muito o mesmo sentimento que muitos de nós tivemos quando éramos crianças e íamos pro shopping.


É um filme lindo, de verdade. Tem um ritmo lento e às vezes parece não ter foco, mas tudo colabora pra criação do clima de nostalgia e slice of life. Deveria ser um clássico natalino por aqui, e por bons motivos. É engraçado, inteligente, e universalmente nostálgico.