Future Love



Ok, eu vou tentar fazer algo que eu nunca fiz antes: eu vou resenhar um livro.

Sim, por incrível que pareça, eu não sou um leitor árduo de livros tradicionais, sempre preferi quadrinhos e a maioria dos livros que eu li na vida geralmente tem algum motivo. Ou é um clássico como os contos de Grimm/Hans Christian Andersen e Mágico de Oz, ou é relacionado a um filme como Nárnia. Na maioria das vezes, as duas coisas.


E... curiosamente, o livro que trago hoje tem um pouco dos dois, mas numa história original, escrita pelo meu amigo Complexo. Logo que ele me disse que a próxima história dele se passaria nos parques Disney, eu já fiquei empolgado, por... motivos óbvios.

Histórias com referências a cultura pop vez ou outra pipocam, como Big Bang Theory e Jogador Número Um. Mas o que a maioria dessas histórias falha miseravelmente é em como usar as referências de uma forma que não seja forçada e que de fato acrescente algo na história, sem esquecer que ainda é, no fundo, um fanservice.

Teria Love Future cometido esse erro, ou conseguiu achar esse Equilibrium?

...meus trocadilhos são tão ruins quanto as minhas referências, sim.


É um livro, então vou botar
imagens random que achei no Google Imagens.
A gerência agradece a compreensão.

A história começa com um YouTuber chamado Hugh, com seu canal especializado em atrações antigas e/ou desativadas de parques temáticos. Ele adora seu trabalho, por mais cansativo e por vezes, ingrato que seja, e seu produtor/melhor amigo insiste que ele arranje uma vida decente, como parar de comer porcaria, dormir tarde, e quem sabe, ter uma namorada.

Hugh começa a matutar sobre isso, até que recebe um chamado urgente de um explorador urbano, que lhe manda vídeos do EPCOT nos anos 80, em cristalina e perfeita qualidade. Incrédulo, Hugh aceita encontrar o tal maluco, que lhe revela um portal pro passado em uma das atrações. O youtuber testa o portal, e de fato vai parar no passado, encontrando uma linda guria chamada Kim, que também é uma nerd de parque. Mas agora Hugh precisa voltar pro seu tempo, antes que algum desastre wibbly-wobbly-timey-stuff aconteça, ao mesmo tempo que se apaixona perdidamente por Kim.


O maior chamariz da história é o cenário onde se passa maior parte do tempo: o EPCOT. Narrado em primeira pessoa, podemos conhecer bem o protagonista e sua paixão pelo lugar, pela História, e como isso se manifesta nele e em seu trabalho e como o parque é parte intrínseca de sua vida. A própria personalidade de Hugh é simpática, e é fácil de se identificar com ele e suas ações, e até seu estilo de vida, por mais que seja legitimamente prejudicial.

E não é porque eu sou um blogueiro com horários irregulares de dormida e comida e que gasta seus dias escrevendo sobre coisas incrivelmente específicas que ninguém se importa. Há uma grande diferença entre mim e Hugh.

...ele ganha dinheiro com isso.

...enfim.

Mas mesmo se tu não souber as minúcias dos parques, não vai se sentir perdido, já que ele te explica basicamente o que tu precisa saber pra história, e até um pouco mais porque... bom, é da personalidade dele. Algumas conversas entre Hugh e Kim servem como foreshadowing pros capítulos finais, mas são diálogos feitos de forma natural, não soam forçados e nem exageram em referências incrivelmente obscuras: elas ficam ali meio que na superfície, coisas que pra quem ao menos conhece um pouco sobre parques temáticos em geral vai conseguir entender pra seguir a história. Quando se aprofundam, tu já tá familiarizado com o nível e consegue segui em frente mesmo sem saber exatamente quem é Michael Eisner.

E esse é o maior trunfo de Future Love.

Duas carecas brilhantes

Pra ser sincero, eu não li o livro Jogador Número Um, só vi o filme. E não, eu não me arrependo, especialmente depois de saber que o maluco lá gasta sei lá quantas páginas quotando Monty Python, eu imagino como deve ser. Raios, o próprio filme me passou muito a idéia daquele trecho de Big Bang Theory que o Howard fica citando elementos de cultura pop antes de uma partida de ping-pong. E essa é a maldita piada. 

Digo, o filme ainda tem um certo mérito por ter idéias interessantes, como o grande plot twist do jogo Adventure (que é uma moral interessante, mas mais digna de um vídeo do YouTube do que uma megaprodução que custou o equivalente ao PIB de Sergipe); mas fracassou ao dar personagens rasos e uma narrativa... Eh.
Sei lá, o filme meramente existe. Tem umas idéias boas, mas... Eh. Eu não consigo me importar.

Future Love é diferente, os personagens são, de certa forma, clichês, mas eu consigo me importar com eles. Há um mistério em torno da identidade de Kim que não é exatamente essencial, mas é interessante o suficiente pra engajar o protagonista, além de criar uma relação interessante entre os dois; Hugh legitimamente cresce e amadurece um pouco no decorrer da história; e as referências aos parques não são hipersaturadas nem forçadas.


Sabe quando em Jogador Número Um a tela se enche de uma pancada de referências visuais a cultura pop e que youtubers fazem trocentos vídeos pra poder achar todos esses easter eggs que... na real parecem mais... easter eggs mexidos... e atirados na sua cara como se Larry, Curly e Moe estivessem brincando de Jenga com tortas... Future Love não exagera no excesso, e as conversas entre Hugh e Kim são típicas de dois aficionados pelo EPCOT, e as discussões entre as mudanças surgem naturalmente, devido ao fato de Hugh ser do futuro. Mas não só isso, eles também conversam brevemente sobre outros aspectos, como política, e especialmente tecnologia. Isso ajuda a não saturar o assunto "parque da Disney" e desenvolver um relacionamento mais crível entre os personagens.

O romance também é bem guiado, deixando tempo pros personagens respirarem na história (mesmo com Hugh constantemente exaltando a beleza e outras qualidades de Kim, mas é ele que tá contando a história e ele que tá apaixonado, então ok). Não é algo que surge do nada, é gradual, e nos dá tempo pra nos afeiçoarmos a ambos os personagens.


A parte mais divertida do livro é quando ele descreve o parque, tanto no passado como no futuro. A forma que ele constrói o personagem, um legítimo conoisseur de antiguidades EPCOTianas, funciona sensacionalmente bem. Realmente dá pra ter uma boa impressão do que era o parque nos anos 80, fruto de uma profunda pesquisa do autor, que não só esteve lá quando criança e certamente usa boa parte da memória (afetiva ou não) pra isso, mas também de vídeos e artigos da época e recentes. E as previsões que ele faz pro futuro, embora pareçam absurdas, não são infundadas, dado o rumo atual da Disney Co..
O fato que o personagem usa uma linguagem de hoje olhando pro passado ajuda muito também. Fica mais fácil de compreender algumas particularidades com esse tom meio nostálgico, mas ao mesmo tempo surreal. Da mesma forma com Kim interagindo com coisas do futuro (nosso presente).

Meu único problema foi mais com o clímax, onde eu me perdi um pouco na narrativa que descrevia um evento meio caótico. Mas... Ao mesmo tempo, era uma situação caótica. Ou talvez fosse a minha falta de intimidade com a atração em questão, mas ainda assim, eu consegui seguir a leitura. Então, qualquer um com um mínimo de conhecimento sobre as atrações pode ler sem problemas.


Future Love é uma história legitimamente interessante, com um plot que talvez não seja o mais original, mas ao mesmo tempo parece algo que poderia ter sido feito nos anos 80/90, tipo... sei lá, Caverna do Dragão. Mas ao invés de irem pra outra dimensão, aqui é o tempo, e funciona perfeitamente até na narrativa do parque.

Sim, os parques tem narrativas e isso é espetacular. Se tu só vai pros parques pra bater foto e postar no Instagram pra tentar preencher um pouco a sua vida vazia, eu te desprezo.

Os personagens são gostáveis, a narrativa é interessante e criativa, sabendo como e onde usar os clichês e dar seu toque pessoal, e o fanservice de choque de cultura devido à viagem no tempo/parque temático Disney é extremamente bem dosado e integrado na história.

Em resumo, é tipo Jogador Número Um, só que bom.


Se tu gosta de sci-fi, parque da Disney, romance e Jennifer Connelly, cê pode comprar o livro pela Amazon no link abaixo. E sim, o livro é todo em inglês, o que é ótimo se tu tiver aprendendo ou quer se familiarizar com o idioma. E se não, comece de agora, me agradeça depois.






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