[Mês do Dr. Seuss] O Grinch (2018) - Parte 1


Grinch da Illumination.

...eu queria fazer uma grande introdução, sobre como a criatividade de Hollywood entrou numa era de escassez tremenda pra poder continuar se sustentando e blablabla.

Mas... Grinch da Illumination. O mesmo pessoal que conseguiu perfeccionar a produção em massa de animações pra crianças de 3 anos e tias de 40 oferecendo a exata mesma coisa de novo e de novo e de novo vai tentar não uma, mas duas vezes adaptar uma obra amada de Dr. Seuss.

Raios duplos.

Então, vamos logo, pior que The Cat in the Hat não pode ser.






Começamos o filme com uma das poucas coisas que serão consistentemente e criticamente boas: o visual.

Olhem isso, as montanhas parecem algo tirado diretamente das artes conceituais 2D, e a cidade dos Who parece feita de biscoito. É um visual cartunesco e bonitinho, que a Illumination sabe fazer, e que desde O Lorax mostrou que consegue fazer isso dentro da estética Seussiana.

O que lasca é o roteiro e execução, o que veremos logo a seguir.




Vemos as lojas dos Whos que se preparam pro Natal, e também...


...uma piada com as versões alteradas de Star Wars.

Eu provavelmente estaria confuso nesse momento, mas sempre é bom tirar sarro do George Lucas quando devido.


Olha só, temos até uma máquina de fazer pilhas de bolas de neve pra crianças! De fato viver nessa Whoville é melhor que a versão live action, com seus habitantes frenéticos e consumistas.

Mas se você sabe qualquer coisa sobre essa história, sabe que todo Who em Whoville adorava o Natal. Mas o Grinch, que morava ao norte de Whoville, passava mal.


E aparentemente ele também não suportava o Michael Jackson pirralho cantando.

E ele faz o que toda pessoa sensata faria: criar pelo menos 200 conto em prejuízo ao jogar coisas aleatórias no despertador até ele cair.

Se meu despertador de repente começasse a tocar um rap de Natal eu também faria a mesma coisa. Aliás, eu CANTARIA 12 Days of Christmas só pra não ter que ouvir um rap ruim de Natal.


E falando em rap ruim, não podemos escapar da versão millenial de You're a Mean One, Mr. Grinch. O que, comparado à versão de 2000, faz sentido. A versão de Jim Carrey mostrava a variedade de personalidades que o ator conseguia emanar, todas com teor cômico e cartunesco. Música que aliás, ele mesmo cantava pra si mesmo, que pode ser interpretado como uma faceta do ego do personagem. Além do mais, a música vinha no momento certo da história, espelhando o desenho original.

Aqui, o cantor mal faz esforço pra cantar, numa versão frouxa, sem sal, e logo no começo do filme que é pra ser diferentão e te dar logo a música que tu já vinha ouvindo nos trailers.

...eu acho, eu mal vi trailer dessa coisa. Mas meu ponto permanece, ambas as versões refletem um pouco a cultura de seu tempo. A de 2000 tentava ser uma releitura mais fiel do original até nas batidas de história, enquanto aqui ele precisa cativar a atenção de um público que já nasce com DDA.



Outro problema do filme é que o Grinch é adorável. E sim, eu sei que é basicamente uma marca do estúdio e eles fazem isso pra poder vender quinquilharias, traquitanas e bugigangas com o rosto do personagem, mas ainda assim. O Grinch começa a história como um personagem detestável, um personagem maldoso, um anti-herói. Ele não pode ser adorável ou ter qualquer resquício de fofura.

E pra isso não precisa ser um monstro como Jim Carrey, que conseguia ser legitimamente assustador, mas ainda ter alguns momentos adoráveis. O Grinch de Chuck Jones era visualmente agradável, mas ele ainda parecia um cara mau, ainda parecia antipático. E só no final que seus traços mudam levemente e ele se torna genuinamente adorável. Até no livro ele muda fisicamente, isso era perfeitamente possível aqui. Mas não, tem que vender pelúcia, bota ele fofinho feito um...

...

Tou tentando lembrar de algum personagem da Illumination que seja legitimamente fofinho. Enfim.



Enfim, o Grinch descobre que não tem mais comida em casa, mesmo tendo se programado pra não ter que sair de casa até Janeiro. E a causa disso é...


...três cenas que foram feitas especificamente pra fazer memes no Facebook.

Como eu disse, a Illumination perfeccionou uma faixa demográfica muito específica.

Continuando, a única opção do Grinch agora é ir pra Whoville e comprar comida. Com que dinheiro? O que ele faz pra sobreviver? Eu sei lá, a construção de mundo desse filme é tão bem estruturada quanto uma torre de broaca.


Enfim, conhecemos então Donna, mãe de Cindy-Lou Who, que não é maior do que... two... can...

...hum.

...

Donna é a mãe de Cindy-Lou, e ela precisa trabalhar de dia e de noite pra poder criar a guria e seus dois irmãos gêmeos, já que o pai não aparece porque... ele... morreu de... divorcitite...?

Sei lá, nunca é explicado.


O Grinch então adentra a cidade, causando caos e confusão por onde passa.


Não falei? CAOS e CONFUSÃO!


Ele então passa pelo grupo Pentatonix que canta God Rest Ye Merry Gentleman, o que gera vários problemas pro estabelecimento de mundo desse filme.

Ignorando o fato que o grupo permitiu que usassem a gravação deles mas provavelmente só mandaram o link pro vídeo do YouTube e os caras da Illumination baixaram usando um daqueles sites conversores direto pra mp3, a música fala diretamente sobre o nascimento de Jesus Cristo e como ele nos livrou das garras de Satanás.


E eles mencionam Cristo e Satã POR NOME.

POR. NOME.

Uma coisa é tu fazer uma história fantasiosa que se passa (nesse caso, debativelmente, já que nunca fica claro) num floco de neve e usar o termo "christmas", que gera alguns questionamentos, inclusive a existência de Papai Noel. Mas eram elementos que já existiam no livro original, então passa.

Mas daí a ser bem mais específico a ponto de mencionar Cristo e Satã desse jeito nesse tipo de história deveria levantar as sobrancelhas dos roteiristas. MAS, de novo, eles tiveram tanto cuidado pra construir o mundo desse filme quanto eu tenho cuidado pra fazer um Cup Noodles.

Porque raios eu ainda me importo? O que eu tou fazendo da minha vida? Oh, céus!

Enfim, prosseguindo.



ALIÁS NÃO, PERA, ainda não. Tem um momento da música que a letra é acompanhada do ritmo de pisadas e nesse momento os Whos fazem isso:



Sim, é basicamente uma gangue natalina do Bronx.



Ok, então o Grinch faz sua feira como se fosse um moleque de 10 anos enquanto zoa uma Who baixinha só pra mostrar que é do mal.



Voltemos então pra casa de... Lou-Who? O nome Lou é parte da família ou só da Cindy-Lou? Enfim, vemos Donna tentando desentupir a pia, fazendo café, e tentando evitar que os gêmeos não se matem de novo. 


Mas os moleques simplesmente REJEITAM todo o trabalho duro de sua mãe.

BANDO DE PIRRALHOS MALCRIADOS E REMELENTOS! MERECEM TEREM SUAS CABEÇAS FATIADAS E DEFUMADAS E SERVIDAS AOS CÃES!



Após essa declaração de desprezo total, Donna se esforça pra não quebrar mentalmente, e a Cindy-Lou mais esquisita da história passa pela sala, observando a cena.

Não, sério, essa Cindy-Lou consegue ser mais bizonha que a do livro. Eu não consigo explicar exatamente o que é, mas esse design dela é meio uncanny. Bom, a personalidade dela é irritante, mas desde o momento que eu bati o olho nela, achei zoadaça, e olha que eu achei até ok quando vi a personagem pela primeira vez como um Funko Pop. Eu pensei "ah parece fofinha, esses boneco da Funko geralmente zoam o personagem" e daí fui procurar uma imagem dela no Google e pelo amor de Oz, que guria estranha.


Cindy-Lou tem que entregar uma carta importante, e a melhor forma de fazer isso é...



...descendo numa bóia usando um taco de hóquei como leme, claro. O que poderia dar errado?



...ah é.



Ao invés de denunciar esse atentado contra sua vida pra polícia, pro conselho do telar, e pro Proerd, o Grinch zoa a guria por ter perdido a carta, mas ela diz que é realmente muito muito importante. O Grinch então sugere que ela vá pessoalmente pedir pro Papai Noel, se é tão importante assim. Exceto que ninguém nunca viu o velho então dane-se.
Claro que ela não faria isso né? Sherlock Holmes jamais sugeriria algo tão perigoso pra uma criança impressionável. Né? Né? NÉ?


Voltando pra casa, o Grinch avista Bricklebaum, o Who Vivo Mais Alegre De Todos™, e tenta passar pela sua propriedade desapercebido, provavelmente com medo de Bricklebaum o expulsar dali à base de carabinada.


Mas ele tem armas mais poderosas, como o total acaso, ao ligar todas as luzes e enfeites de Natal, incluindo um boneco de neve...


...que dá um socão no Grinch.



Bricklebaum se desculpa pelo Frosty, mas explica que a prefeita quer quer o Natal seja 3 vezes maior esse ano.

Entenderam? 3 vezes maior? Natal? Porque o coração do Grinch vai crescer 3 vezes? CLEVEEEEEEERRRR


O Grinch então volta pra casa zombando da pretensiosidade Natalina dos Who, enquanto anoitece e podemos ver que a Illumination, assim como a Sony, tem ÓTIMOS artistas trabalhando. Quando eles se esforçam pra fazer algo realmente bonito e criativo eles se superam.

Infelizmente, assim como a Sony, escolhem os piores projetos pra trabalhar.
Exceto Aranhaverso. Esse é mó dazora.


Então vemos Cindy-Lou, que fez o pior cospobre possível de Cartman pra ir pro Pólo Norte encontrar Papai Noel. Mas sua mãe usa um pouco de psicologia materna e a convence a voltar pra casa.

O que é adorável que Cindy-Lou não tenha se tocado até então que levaria muito tempo até ir e voltar do Pólo Norte a pé, é basicamente como uma criança pensaria mesmo. Eu diria que ela é uma criança adorável e não é mais uma criança-prodígio, mas ainda temos um filme inteiro pela frente pra discordar disso.


No covil do Grinch, vemos que o verdão provavelmente é fã de Cidadão Kane, caso contrário não teria motivo pra ter uma mesa desse tamanho. Ou isso ou ele só tem Cidadão Kane e os desenhos do Coyote pra assistir. Do jeito que ele é ostracizado e odeia ter que ir pra cidade, eu não duvidaria.
...hey, esse universo tem sua própria versão de Jesus e de Satanás, uma versão Who de Cidadão Kane não é tão impossível como cê pensa.

Ele pergunta ao seu cãozinho o que ele quer fazer hoje.
Bom, vejamos o que se passa na cabeça de Max:


...huh.


Mas o Grinch tem uma idéia melhor, tocar All By Myself num órgão gigante.


Mas Max faz uma zona com a bateria, destoando totalmente da música, e o Grinch o expulsa. Alguns segundos depois...


...ele aparece e pede perdão.

...

...

Porque sensibilidade é evidentemente um traço que o Grinch teria.

E sim, eu sei, eles podem querer mostrar que o Grinch só mostra esse lado mais sensível (ainda que relutantemente) com seu cãozinho, porque é a única criatura que ele legitimamente se importa. É por ver que Max não tem comida que ele vai pra cidade, afinal. Mas pra esse tipo de história, isso não funciona. Nas outras versões do Grinch, ele era vaudevillianamente maldoso, mesmo que na versão de Carrey ele tivesse alguns traços simpáticos, todas tinham uma camada grossa de sarcasmo, ironia, ou um ego inflado, ou só cinismo. São falhas que fazem sentido dentro do personagem e que são mudadas ao final do filme, que é o propósito da história, mostrar como alguém tão detestável e sem amor pode passar a amar o Natal e ser generoso e altruísta.

Se já vemos o Grinch ser um coração mole no começo do filme, não há evolução no personagem e a moral da história fica diluída.

Mas, de novo, não dá pra vender doce com a cara dele se fosse assim.


O Grinch sente um terremoto e sai de casa pra verificar, e é...



UM DESTRÓIER IMPERIAL NATALINO! AAAAAHHH!


BRICKLEBAUM! VOCÊ É UM DELES! VOCÊ SE TORNOU O QUE JUROU DESTRUIR! VOCÊ ERA O ESCOLHIDO! GAAAAAAAHHH
...
Me lembrem de nunca mais escrever artigos depois de beber Tang Guaraná fora da validade.
Se bem que eu não lembro agora se eu bebi ou cheirei o pó do Tang, mas divago.



Enfim, todos de Whoville começam a levar seus enfeites pra grande árvore, inclusive Cindy-Lou e sua família, mas a guria tem outros planos.


Essa imagem não tem nada de especial, só queria apontar que quem faz a voz da prefeita é a Angela Lansburry, também conhecida como Sra. Potts em Bela e a Fera; Sra. Price em Se Minha Cama Voasse; e a senhora dos balões em Mary Poppins Returns. E também Murder, She Wrote, que eu descobri dia desses e parece interessante.


Prosseguindo, Cindy-Lou conta pro seu melhor amigo o plano de ficar acordada de noite pra ver Papai Noel pra poder pedir pra ele que sua mãe seja feliz. A guria nota que a mãe trabalha demais de noite e de dia cuidando deles, e quer que a vida dela seja mais fácil.

...ok, eu tou até gostando dessa Cindy-Lou. Ela é adorável, e parece ser mais consciente que eu esperava. Tem muito das características da Cindy-Lou de 2000, querendo ajudar alguém que ela se importa. No live-action era Jim Carrey, e aqui é sua mãe.
Oh, se ela soubesse que Jim Carrey diria "eh, porque não?" pro live action de Sonic...



Mas o Grinch tem outros planos pra essa noite, como um plano estratégico e sutil pra acabar com a árvore dos Who..


...OU ELE PODE SIMPLESMENTE ARRANJAR UMA CATAPULTA GIGANTE, CLARO.

E eu achei que a única semelhança dele com o Willy Coyote era o estilo da caverna. O que falta agora, a armadilha dar errado e acabar arremessando o Grinch?


Oh, there we go.

Pra tornar mais irônico só falta ele mesmo ligar a árvore sem querer e-



...ok.


Also, eu gostaria de ressaltar que a cena da árvore se iluminando é linda, e até tocam uma versão em coral melódico de Welcome, Christmas. De novo, temos gente talentosa trabalhando nesses filmes.


E no meio dessa algazarra festiva, o Grinch tem um momento de flashback...


Uh... flashback errado.


Ah, agora sim. Grinch se lembra desse mesmo período quando era um órfão abandonado. Por nunca ter tido uma família, ele odiava o Natal e odiava ter que lembrar que ele era sozinho no mundo.
O que... Acaba sendo uma história um pouco melhor que a da versão de 2000. Mas, cada versão é meio que um reflexo de seu tempo.

A versão de 2000 lidava com bullying e uma criança que tentava se adaptar ao meio social que vivia. Era um tema recorrente na época, mas hoje os valores e dificuldades mudaram. E é até bom que o filme tente pegar outro aspecto, ao invés de só refazer o que a versão de 2000 fez, e nessa versão é algo mais sutil e mais palpável. Existe gente que odeia o Natal por algum trauma passado, ou por lembrar alguma coisa difícil de encarar em sua vida. Muitas vezes esses traumas vem de infância, então é um tema que faz sentido e que quanto mais cê pensa nessa versão, mais sentido ele faz.

O Grinch aqui era diferente de todos os outros Whos, sem necessariamente dar uma história de origem. Ele simplesmente nasceu diferente e estranho, o que o levou a nunca ser adotado por ninguém. Provavelmente nenhum Who queria uma criança nudista, mas eu divago.

Meu ponto é que essa origem do ódio pelo Natal do Grinch também é identificável e comum, e talvez muita gente se sinta tocada pela forma que o personagem foi construído aqui.

Also, a narração sempre é rimada, e nesse momento é onde ela mais se faz presente, e tem uma transição suave da narração pro Grinch de novo, quando ele continua o que seria narrado mas ainda dentro do contexto da cena. Muito bom.


Então o Grinch pensa, pensa e tem uma idéia. Uma incrível idéia. O Grinch teve uma incrível terrível id-OLHA ESSE GRINCH NESSE MOMENTO! ELE É MAL! ELE É VIL! ELE É TENEBROSO! É ESSE O TIPO DE DESIGN QUE DEVIA TER SIDO DESDE O COMEÇO! ELES CONSEGUEM FAZER UM GRINCH QUE SEJA VISUALMENTE AGRADÁVEL MAS MALIGNO!

GAAAAAAHHHHUBLJKJGJ

...

Continuamos na semana que vem, então, onde veremos o Grinch colocar seu plano em ação.



Esse artigo foi feito graças aos apoio dos padrinhos João Carlos e Cauã Alves. Se quiser ajudar o SRT a crescer e ainda dar pitaco no que pode aparecer por aqui, dá um pulo no Padrim e considera ajudar com uma doação de coração. Caso queira ajudar de forma não-monetária, compartilhe o artigo nas redes sociais, no Whatsapp, Telegram, sub-nick de MSN, qualquer coisa serve.