Death Note: A Trilogia de Live Actions


Death Note foi uma série marcante, por vários motivos. Alguns de vocês que lêem este blog estavam na adolescência, naquela fase de procura uma identificação, e quando provavelmente coisas incrivelmente sombrias e depressivas te atraíam, quase como uma forma de você mostrar ao mundo como estava maduro.

Mas na real você queria mesmo era ser notado e não notava como a maioria desse material que você consumia era risivelmente pretensioso e mal feito. Mas você não ligava porque "OOOOOH, A TRISTEZA, A DOOOOR".
É interessante mencionar que foi nessa época que saiu Homem-Aranha 3, X-Men 3, e outros filmes no mesmo estilo, então...


Enfim, Death Note conquistou aquela garotada que queria ver algo mais maduro, mais sério, sombrio, e encontravam refúgio em animações japonesas e na tribo dita ""otaku"". Confesso que eu cheguei perto nessa época, mas a animação nunca surtiu muito interesse em mim. Eu levei um tempo a mais pra começar a assistir com vontade, porque... Bom, o desenho parecia muito sombrio (em termos de fotografia) e monótono.
Na época eu assistia One Piece.

Talvez hoje tenha o equivalente a Death Note, mas eu não tenho saco de acompanhar esse meio e nem é sobre isso que eu quero falar hoje.

E como o início dos anos 2000 agora é nostálgico, empresas começaram a investir nesse filão, e a Netflix anunciou o tão adiado remake ocidental de Death Note. O que me motivou a resenhar todos os live actions de Death Note. Sim, todos os 3 filmes e (se possível) as mini-séries recentes. E obviamente, irei resenhar o da Netflix assim que sair, também.

Então, comecemos com...


Death Note


O primeiro filme conta sobre Raito Yagami, um estudante de Direito que tem uma vida normal e maçante. Até que ele hackeia os arquivos da polícia, e descobre vários casos de criminosos que foram soltos, e perde a fé no sistema de justiça. Enquanto ele seguia um desses criminosos (sabe lá Deus o motivo), Raito encontra um caderno com o poder de matar o nome daquele que estiver escrito nele. O rapaz então começa a usar o caderno pra matar criminosos que por algum motivo, continuaram soltos ou foram libertados.


Uma vez que se nota um padrão nas mortes e nenhum foi causado por doença, os assassinatos começam a serem creditados a Kira, e dividem a opinião pública: alguns o veem como um anjo, outros como um demônio. O que complica a situação pro pai de Raito, que é chefe de polícia e líder do grupo responsável por capturar Kira.
Mas a polícia tem a poderosa ajuda de Batman, digo, Batman, digo, Batman, digo, L.

...digo, Batman fraco e sem uniforme. Qualé, melhor detetive do mundo, cheio de parafernália tecnológica, ninguém sabe quem é o indivíduo, e tem um velho que cuida dele. É o Batman.

Enfim, agora o palco está montado para que haja uma batalha mental entre Kira e L, e... É basicamente isso.
Mas eu me adianto, falemos da narrativa.


Adaptando sabe-se lá quantos episódios da animação e dos quadrinhos pra duas horas é uma tarefa complicada. E o filme consegue ser competente em adaptar os pontos principais numa narrativa coesa e com alma própria. Obviamente alguns elementos são totalmente excluídos ou retrabalhados, mas o objetivo da obra principal permanece o mesmo: mostrar o que acontece quando damos poder praticamente ilimitado a um ser humano. No caso, o poder de fazer justiça com as próprias mãos a um humano que não acredita mais na polícia e nos tribunais.

Raito é um cara comum, que vive relativamente próximo aos crimes e a polícia, já que seu pai é chefe de um dos departamentos. Fazendo valer aquela frase do famoso caçador de vampiros, "Dê poder a um homem, e verás o seu caráter". E o ator de Raito consegue fazer bem essa transição.
...na maior parte do tempo.


O melhor exemplo que eu consigo pensar é no Hayden KRISTOFFSEN, que não é necessariamente um mau ator, mas que em Star Wars recebia direções ruins de um diretor ruim. No caso do cara como Raito, ele tem algum talento como ator, mas o personagem exige tanto que ele seja um cara relativamente frio e calculista, que a atuação toda é nesse tom. Em defesa dele, não vemos tanto ele antes de ser Kira, e nesses momentos, ele consegue passar a idéia de um cara normal, mas desiludido.

Mas poderia ter sido feito uma mudança mais suave, mesmo com o estilo japonês de atuar, que é naturalmente meio "duro" ou "forçado". Quando ele precisa expressar alguma emoção extrema, ele o faz com naturalidade e convencimento.

Felizmente, ele é o único com um ou outro problema de atuação, porque todo o elenco é incrivelmente verossímil. A irmã de Raito é adorável; o pai tem uma atitude dura, mas protetora, que vem do que ele enfrenta diariamente; e L consegue passar a idéia de um cara estranho.

Aliás, falemos mais do L, porque esse é um personagem pouco explicado nesse filme.


L é o melhor detetive do mundo, mas os hábitos dele são estranhos. Ok, no original é explicado os pormenores de como ele funciona (ao menos até onde lembro, só vi o desenho uma vez em 2010), mas aqui é tudo feito "porque sim".

Se você conhece a história original, não vai te incomodar. Mas pra quem não conhece, só soa desnecessariamente estranho. Não que isso vá atrapalhar o filme, talvez até seja interessante ouvir de alguém cujo primeiro contato com Death Note seja o filme.

E o ator consegue nos dar uma performance que é caricata, mas que ao mesmo tempo se leva a sério, o que é uma façanha incrível.


É um filme que é surpreendentemente bom. Ainda se sustenta como um bom filme de investigação. Claro que tem um plothole aqui e outro ali, mas o filme trabalha pra que haja a suspensão da descrença em prol de um conceito genuinamente interessante. O único buraco gritante que eu lembro é: como raios o Raito conseguiu botar um celular com TV, um pedaço rasgado do caderno, e uma caneta dentro de um pacote de batata estando com a casa inteira sob vigilância?


E não é algo que não poderia ser explicado, o filme faz questão de nos mostrar Raito escrevendo e narrando como vão acontecer as mortes depois que elas acontecem, e Ryuuku é usado como a ponte entre o protagonista e o público, sendo reservado ao anjo da morte o trabalho de ter que ouvir a explicação dos planos de Raito.
Também funciona vice-versa, com Ryuuku explicando as regras do caderno, aliás.

Mas nunca explicam como raios ele conseguiu a proeza de esconder tanto objeto sob forte vigilância, e quando tu para pra pensar nisso, é uma falha imensa.


Spoilers nesse parágrafo. 

Outro plothole é Raito já saber o nome de Naomi, e ainda assim ele escrever o nome falso dela num pedaço do caderno na frente dela, sendo que ela tava dando o nome pra ver se ele mordia a isca. Ora raio, se ele já sabia o nome dela, pra que deixar que ela soubesse o método exato de como ele mata? O inteligentíssimo e calculista Raito não faria uma ação mal planejada dessa. Isso é um erro do tamanho de Roraima, pelo amor do milho!


Enfim, Death Note continua sendo bom, mesmo com essas falhas. Os efeitos visuais de Ryuuku é digno de uma cutscene de Playstation 2 e vira e mexe a composição dele na cena soa falsa. Eu poderia fazer um parágrafo inteiro de piadas sobre a CG desse filme, mas as imagens falam por si.
O plot não tem regras de mundo muito complexas, mas talvez precise de um pouco de atenção pra acompanhar alguns pormenores. O filme em si não é exatamente empolgante, e o que ele faz mais é preparar o palco pra atração principal...



Death Note - The Last Name


O segundo filme começa extamente onde o primeiro acabou, inclusive tocando Dani California do Ré de Hot.
Porque motivos.


Porcausa da morte de Shiori no primeiro filme, Raito insiste em participar da equipe investigando o caso Kira, como uma forma de vingar a morte da namorada. Ao mesmo tempo, surge a idol em ascensão Amane Misa, que começa a usar um Death Note e oferece ajuda a Raito. E finalmente podemos ver a batalha que esperávamos, o jogo de gato e rato mental entre Raito e L.
E não nos decepciona.


Cada passo é exaustivamente detalhado pelos personagens, ao mesmo tempo em que cada um mostra suas personalidades. Os atores fazem um ótimo trabalho ao fazer as duas coisas, com Raito sendo um pouco mais frio como Kira, mas um pouco mais solto quando em um certo momento, deixa de ser. E aqui vemos como ele é um ator com talento, quando Raito fica no clímax da pressão e como um cara gentil e de boas pode se tornar tão imaturo e inconsequente, mesmo tendo tudo aparentemente sob seu controle.

L continua sendo apático e estranho, mas é basicamente o que o papel dele pede. Ainda assim, não é explicado porque raios ele age dessa forma, ele é só estranho porque sim. Ao menos o método de trabalho dele funciona, então ninguém pergunta, induzindo a platéia a não perguntar também.
Não sei deixa de ser uma falha, mas né.


Erika Toda consegue passar perfeitamente a imagem de uma adolescente cabeça de vento, mas ao mesmo tempo com uma certa capacidade de bolar estratégias. Não são estratégias perfeitas, mas ajuda a criar a veracidade da personagem em querer ajudar o Kira. Mentalmente, ela ainda é uma criança, mas a personagem é executada de uma forma que é adorável sem ser chocolatantemente irritante.

Vocês sabem, como era no desenho.

Deus sabe como eu queria enfiar uma faca na cabeça daquela loira oxigenada cada vez que ela abria a boca.


Mas aqui ela é fofa, doce, inocente, mas sem ser exagerada. Erika é uma boa atriz, e um ano depois, integrou o elenco do live action de Liar Game, que tem narrativas e estratégias semelhantes a Death Note.
Me cobrem uma resenha de Liar Game.

Oh sim, nada de anormal aqui.
Se fosse no CEFET.
Cada personagem tem suas motivações bastante claras, especialmente os Kiras. Raito já foi bem explorado no primeiro filme e Misa tem uma história de fundo tanto trágica quanto interessante, bem como um terceiro Kira que aparece lá pela metade do filme. E o melhor é que o ritmo da narrativa é bem fluido, nada se sente como um filler ou perda de tempo. Até o motivo da protecão de Rem a Misa não é em vão.

A parte da investigação do filme é bem montada e desenvolvida, e o fato de L deduzir praticamente tudo perfeitamente pode parecer forçado... E talvez essa seja uma falha da narrativa.


Nós estamos acompanhando tudo de perto, sabemos como as regras e mecânicas e estratégias acerca do Death Note funcionam. Mas L não, e quando ele acerta praticamente tudo, a platéia tende a pensar "ooooh ele é muito inteligente". O que... pode ser verdade, afinal ele é o maior detetive do mundo, dedução infalível é um dos "poderes" dele.

Mas quando você para pra pensar que essas deduções vem sem muita explicação, se torna pouco verossímil. Quando Sherlock traçava o perfil exato de alguém através de um chapéu perdido, ele explicava ponto a ponto os motivos, como cabelos grisalhos, um pedaço molhado, etc. Aqui não temos o mesmo nível de explicação, e nem mesmo a falta dela necessariamente faz parte do personagem, como... sei lá, o Monk. Ele tinha um palpite, não sabia exatamente o motivo, e até em alguns momentos ele errava. Mas fazia parte do personagem, que tinha TOC e outros problemas semelhantes.


A CG dos anjos da morte ficou melhor, comparado ao primeiro filme. Não ficou perfeito, porque a animação/captura de movimentos ainda é meio estranha, mas ao menos a renderização tá melhor, as texturas reagem melhor ao movimento de câmera e iluminações. Parecem mais cutscenes de PS3 do que PS2, o que não é suficiente pra ser realista, mas... São criaturas de outro mundo. Espíritos. Fica um pouco mais aceitável quando se pensa nesse sentido.


The Last Name é um filme bem mais sólido e competente que o primeiro, em termos de nos dar uma narrativa empolgante. Acontece muita coisa e tu sente que se passam duas horas, mas não por ser maçante, e sim pela quantidade de informação e elementos narrativos.

Ainda se sustenta muito bem, mas por algum motivo ainda sinto um filme meio "morno". Sei lá porque. É interessante de assistir, e até serve meio que como uma cápsula do tempo pra quem acompanhava o meio dito ""otaku"" na época. Mas como filme de investigação, ainda é interessante e vale ao menos uma assistida.

Mas ainda falta uma peça na trilogia, que é um filme contando sobre os dias finais de L.

L Change the World


Lembra como os outros dois filmes eram interessantes estudos de personagem, bem como um jogo mental de gato e rato com investigação policial?

Esquece tudo isso, o que temos nesse terceiro filme não tem absolutamente nada que tornou os outros dois interessantes, mesmo com a proposta de nos mostrar um lado mais humano de L. O que... em parte faz, mas não é tão interessante quanto parece.



A história conta sobre um grupo terrorista que usa ambientalismo como fachada, que desenvolveu um vírus ridiculamente poderoso e incontrolável, mas não pode vendê-lo sem ter um antídoto. Um cientista consegue desenvolver, mas a sua parceira é líder do tal grupo, que quer usar o vírus pra limpar o mundo de humanos e deixar a Terra se desenvolver sozinha de novo.

Enquanto isso, a filha do tal cientista e um guri sobrevivente de uma vila com a tal doença acabam ficando sob a guarda de L, que fará de tudo pra encontrar o cientista capaz de criar a cura pro vírus.

E... Rapaz, que filme chato. E lento. Não só lento, mas maçante.


Veja bem, quando os outros dois filmes eram lentos, eles tinham um motivo. Era uma investigação, pouca coisa acontecia, mas era desenvolvimento e debates sobre as teorias de quem seria o culpado dos crimes e como provar isso. Era muito pesado em diálogo, mas funcionava porque essa era a proposta, e ele conseguiu se sair bem.

Aqui, não há mistério, é basicamente uma corrida contra o tempo. Mas tu não consegue sentir o peso da situação, porque os personagens são incrivelmente planos. Acompanhamos Raito e suas motivações de se tornar Kira, mas a doutora Kujo tem motivações tão frouxamente explicadas que é quase impossível de simpatizar ou mesmo entender o lado dela.

Criar um vírus tão mortal e transmissível quanto discurso comunista em faculdade de História só pra eliminar parte da humanidade pra que a Terra possa se regenerar sozinha. Meu Deus, nem os vilões de Capitão Planeta pensariam num plano tão retardado assim.

De novo, nada de anormal aqui.
Uma vez que não tem investigação, o filme perde a essência da franquia. Que sim, por ser um spin-off não deveria focar no Death Note, mas ao menos poderia ser desenvolvido uma caça entre L e o criador do vírus, aquela batalha de mentes que vimos durante toda a existência do personagem.

A única coisa que se salva são os protagonistas. Kenichi ainda dá uma atuação incrível como L, mantendo o aspecto estranho do personagem, mas ao mesmo tempo mostrando o lado mais humano dele. O que é uma proposta interessante, e até funciona quando ele interage com as crianças (mesmo com momentos clichês).
As crianças também são adoráveis, e até a jovem Maki (que mais tarde apareceria em Q10) consegue nos dar uma performance de uma personagem com medo, angustiada, mas ao mesmo tempo mais despreocupada e até dissimulada.
O molequinho faz o melhor que pode, e o personagem dele não pede tanto, então ok.

Live the love generation
Yeah, yeah, yeah...
E eu até gosto do L, do conceito do personagem. Mas é uma pena que ele esteja em um filme sem propósito, sem amor, e feito de qualquer jeito tentando pegar um dinheirinho rápido (custou a metade dos outros dois filmes).
É um filme maçante, lento, sem carisma, e que não adiciona nada de relevante ao mundo da franquia.
Curiosamente, quando eu era novo eu gostava mais desse do que o The Last Name. Mas eu era um jovem tonto que achava que Ataque dos Clones era aceitável, né.


Death Note é uma franquia que divide muita gente. Alguns amam pela situação incomum em que a polícia e as leis são colocadas, testando princípios de moralidade e justiça; e outros não aguentam a pretensiosidade ou popularidade e decidem ignorar.

Eu consigo compreender ambos os lados, mas eu tendo um pouco mais pro primeiro. É um conceito interessante, ele consegue nos dar personagens compreensíveis e identificáveis, ele questiona alguns princípios de justiça que sempre estarão em voga. E mesmo sem isso, ainda é uma investigação interessante. Meio clichê e previsível, mas funciona

Se você gosta de filmes sobre investigação e não liga pro detetive basicamente sempre acertando as deduções (como Sherlock Holmes ou o Monk), eu diria pra dar uma chance a Death Note. Não é perfeito, mas ainda tem conceitos interessantes, e que podem servir de inspiração pra outras obras.

Tipo Code Geass.

Me cobrem de resenhar Code Geass.

A cara dessa guria da frente de "lá vem o maluco de Filosofia"
é impagável.



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