A Christmas Carol (2009)
Robert Zemeckis é um cara que tem um certo histórico com a Disney, sendo bem conhecido pelo filme Uma Cilada Para Roger Rabbit. Fora da Casa do Rato, ele é conhecido por Náufrago, A Casa Monstro, e Beowulf.
Ah, é. E De Volta pro Futuro também.
Em 97, fundou a Image Movers Digital, junto com outros 2 caras, produzindo Revelação, Náufrago, e O Expresso Polar. Em 2007, a Disney entrou na parada e juntos produziram Um Conto de Natal, com Jim Carrey como metade dos personagens.
Não, sério, tem umas 3 linhas só de personagem dele no IMDB.
Antes que eu comece a divagar sobre os rumos da IMD, vamos logo dar uma olhada nesse filme.
A história, caso você tenha vivido na Coréia do Norte durante os últimos anos, narra sobre Ebenezer Scrooge, que é um velho sovina com um coração tão gelado que a se a Elsa estivesse por perto ela estaria usando moletom. Ele odeia o Natal, alegria, festividades, e jujubas coloridas. Até que é visitado pelo seu falecido sócio, que o avisa de 3 fantasmas que o assombrarão pela noite, pra que Ebenezer crie algum juízo e amor no coração.
Ao contrário da versão de 38, essa é bem mais desenvolvida, obviamente. A narrativa possui mais nuances e temos um desenvolvimento melhor de Scrooge, mas curiosamente, não dos outros personagens. Não que eles sejam ofuscados, mas definitivamente sofreram um downgrade.
E sim, isso pode ser um problema.
O pequeno Tim, que normalmente é uma grande parte da história, aqui aparece pouco. Na versão de 38 víamos ele na igreja, cantando com força, ajudando a botar a mesa; raios, a primeira cena envolve ele e o sobrinho de Scrooge brincando na neve! Isso conta muito pra sentirmos a falta dele mais à frente do filme.
Mas isso não implica dizer que a morte dele é menos sentida. Pelo tempo que ele e seu pai passam em tela, você cria uma certa conexão com eles, só não é tão forte. O que nos leva a uma das cenas mais fortes do filme, quando Ebenezer é forçado a encarar o rosto desesperado e choroso de Bob.
Outras coisas boas feitas são os ambientes, aliados ao timming. Ele te deixa absorver a atmosfera do filme, e ao contrário do que se espera, é de fato um filme sombrio. Ele se lembra de que é um filme que envolve fantasmas, e quando ele tenta te dar calafrios, rapaz, ele tenta, e se bobear consegue um susto ou dois. Nada muito excessivo, claro, apenas aquele sustinho básico, inocente, de boas.
E... Embora a cena de Marley tenha momentos extremamente passáveis (o que raio era pra ser o lance da mandíbula? Engraçado?), o build-up da cena é fantástico, bem como os momentos com o fantasma do futuro. Claro, a cena de perseguição foi além de forçada e desnecessária (provavelmente aquele momento que o diretor/roteirista diz "precisávamos de um pouco de ação nesse momento" nos comentários em áudio, ao qual eu responderia "precisavam que era uma manga"), mas quando funciona, é uma beleza. As decisões estéticas e argumentais se encaixam perfeitamente, com o fantasma sendo literalmente uma sombra, e torturando Scrooge na cena da lápide, ao ponto de eu chorar de pena do velho.
Sim eu chorei com esse também.
Então, falemos da animação, e de quebra, de Scrooge.
Animação por captura de movimentos é um tópico que normalmente divide opiniões. Há quem odeie e há quem... Estranhe, mas aceite. Há de fato usos que justificam e aperfeiçoam 100% o uso dessa técnica. Como por exemplo, no Despertar da Força, que exigia uma atuação genuína de Lupita.
O ponto é: é algo bom, porque os atores tem, de certa forma mais liberdade pra atuar, sem a limitação das roupas e maquiagem. Por outro lado, se vai usar atores de verdade, porque não fazer logo todo em live-action? Só tá tirando/limitando as possibilidades de expressão dos animadores.
E eu consigo ver perfeitamente ambos os lados.
No entanto, no Christmas Carol em questão, eu diria que não incomoda tanto... Na maior parte do tempo. Londres é belíssimamente reproduzida, abrindo com um voo pela cidade que é literalmente de arrepiar; as cenas com os espíritos são inteligentes e nos dão ótimos visuais (em especial o do presente), e as atuações se mesclam "ok" com a parte CG.
Mas eu estaria mentindo se dissesse que não há nada estranho. Os cabelos, em especial de Scrooge, ainda se sentem muito pouco naturais, quase como aqueles testes de pelo que cê vê em making-of. Cê sabe, aqueles que tem um monte de pelos e o cara fica passando uma bolinha neles, ou quando é uma bola com pelos que os cara ficam balançando pra lá e pra cá pra ver como eles vão reagir nessas situações.
Sim, é um pouco estranho. Menos estranho do que eu fiz parecer, mas tu nota.
E na cena da festa de Fezziwig, as atuações se tornam exageradamente over-the-top cartunescas. Cê pode fazer o argumento de que era uma lembrança romantizada de Scrooge, mas há limites até pra isso. O filme vinha desenvolvendo um tom realista, não tinha porque mandar a vaca pra lua.
Seja lá o que isso signifique. Eu ouço essa expressão desde Perninha e o Pé de Feijão e nunca fui atrás de saber. Enfim.
E Jim Carrey como Scrooge é fantástico. Ok, no final ele fica muito exagerado e mais Carryano (até referenciando o Grinch), mas ele mostra que consegue fazer um personagem mais sério e dramático, com o toque caricato necessário. Scrooge é um personagem muito difícil de fazer, ele tem um nível de crueldade em suas palavras que, se não forem bem compreendidas, pode acabar sendo uma atuação básica e sem vida. E Carrey consegue dar tudo de si pra que saia direito. Bem como o fantasma do passado e do presente, que também são interpretados por ele. É uma idéia fantástica, e que justificaria o uso de motion capture. É como se fossem personalidades dele, o algo bom nele falando mais alto e tentando mudar a si mesmo. Eu sei lá, tirem suas conclusões.
Em resumo, sim, é um filme meio misturado. Tem muitos elementos que ficaram fora do tom (em especial o final, que ficou BEM mais apressado, comparado a outras versões como a de 38 e dos Muppets; eu pessoalmente gostaria de ver mais), mas o que funciona, realmente funciona. Não é um clássico ou a melhor versão, mas definitivamente é muito boa e aproveitável.
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