[Mês do Dr. Seuss] Horton e o Mundo dos Quem (2008)


Adaptações de Dr. Seuss tiveram um caminho doloroso nos últimos anos. É um fenômeno a ser estudado, nos anos 60 cada especial que saía era praticamente um clássico, mesmo com um orçamento equivalente a um episódio do Chaves. Enquanto isso, mega-produções com tecnologia de ponta pós-milênio foram... questionáveis.

Claro, Grinch só precisava de uma aparada nas pontas e um redesign dos Whos (imagina se existisse a internet naquela época), mas The Cat in the Hat definitivamente matou adaptações live-action dos livros, por motivos óbvios.

Mas nós quase poderíamos ter vivido numa timeline diferente. Logo após o desastre peludo com Mike Myers, a viúva do Dr. levou os direitos autorais pra Fox, já que a Blue Sky tava atrás de fazer um filme baseado em Horton.

Provavelmente pra testar os próprios limites, já que eles tinham acabado de fazer dois filmes com histórias originais (Era do Gelo e Robôs), e tentaram fazer uma adaptação pra sei lá expandir os horizontes.

E assim tivemos Horton, a primeira boa adaptação de Dr. Seuss pra um longa.

...porque falhou?


Não financeiramente, isso é. O filme custou menos que 90 milhões e arrecadou quase 300 milhões, mas meu ponto é: porque a dona Audrey Geisel não prosseguiu com a parceria?

Bom, vejamos o filme antes.


Horton Ouve um Who (ou Horton e o Mundo dos Quem; o livro não foi traduzido pra português então sei lá como ficaria uma tradução mais fiel) conta sobre Horton, um elefante que ouve um grito de socorro em um grão de pó, e descobre que há uma cidade inteira naquele pó. Ele então decide levar a cidade pro topo de uma montanha, onde eles estarão seguros, mas a cangurua era basicamente a prefeita do lugar e proibiu Horton de falar com pó.

...agora que eu falei isso em voz alta eu notei como é ligeiramente surreal, sim.

Aliás eu nem lembro se a cangurua era prefeita ou só uma tia metida na vida dos outros, no livro e no desenho dos anos 60 ela é basicamente isso. Enfim.

O negócio é que Horton é basicamente o Tio Raia local, ele anda pela floresta com um monte de criança ensinando sobre a fauna e flora da floresta enquanto é atacado pela mesma. O lance dele falar com gente que supostamente não existe poderia ser prejudicial. Então sim, a cangurua é basicamente a Marge Simpson do tempo em que Simpsons prestava só que com algum poder político, eu suponho.


O contato de Horton com a população da partícula é através do prefeito, que tenta alertar a população sobre a situação após consultar uma cientista que soa como um esteriótipo do esteriótipo dos nerds de Bully, mas é obviamente desacreditado de todo mundo. Also, ele tem 96 filhas e um filho mais velho, que vai ser o próximo prefeito.

Porque aparentemente é assim que funciona a política dos Whos. Ok. Mas o moleque é basicamente um emo que se recusa a emitir qualquer som que venha da sua boca, assim como o Dwayne de Pequena Miss Sunshine, aquele filme onde Steve Carell era um professor pedófilo e gay.

...ah sim Steve Carell dubla o prefeito. Eu devia ter dito isso antes, faria mais sentido do ponto de vista lógico.

...

Hey, sabiam que a piveta de Pequena Miss Sunshine participou de uma série de fotos promocionais pros parques da Disney? Ela tava numa foto junto da Julie Andrews; a Julie como a Fada Azul e a guria como Fira, uma das fadas que aparecem nos livros da Sininho. Exceto que nos livros ela é negra e tem um cabelão, então eu não faço idéia do porque RAIOS denominaram ela de Fira nessa foto. Só não causou outrage porque absolutamente ninguém além de mim se importa em ver essas coisas.

Digo se uma atriz latina faz uma personagem branca ninguém reclama, mas se o contrário acontece é uma desgraça né.

...se bem que essa série de fotos não parece focar tanto em fidelidade, já que a Beyoncé tá de Alice.  O lance era basicamente jogar um monte de rosto conhecido pra atrair gente pros parques então ninguém teve ter ligado pra nada mesmo.

Also a Whoopi Goldberg é o Gênio, o que é engraçado porque essa não é a primeira vez que isso acontece

"She's my mom", eu sempre perco meus lados nessa parte.

...do que eu falava? Ah sim, Horton.
...
Seguinte, o nome do moleque emo é Jojo, então ou eu fazia esse derail ou uma piada de Jojo's Bizarre Adventure, e todos sabemos que essa seria a rota mais fácil.

Eu poupei vocês de uma tortura maior e ainda dei informações que vão fazer você se questionar "ok o que eu faço com essas informações agora?".
De nada.


Essa é uma das melhores adaptações de Dr. Seuss até Ovos Verdes com Presunto, ao menos as que expandem os livros em histórias maiores. Porque eu não mencionei ela em Ovos Verdes? Porque eu não tinha visto até então. Mas é, esse filme consegue ser engraçadinho, carismático, e trazer os temas surpreendentemente complexos do livro.

Vejam bem, uma das frases emblemáticas do livro original é "Uma pessoa é uma pessoa, não importa o quão pequena". Muito vêem isso como uma forma de Dr. Seuss falar contra o aborto, e embora eu consiga entender essa visão, essa não era a intenção dele.

Todo o tom da história, do curta dos anos 60 (que teve a participação do velho Ted,) e esse filme tratam sobre o mesmo tema: fé. Horton acredita, tem provas de que existe uma cidade habitada dentro de um grão de pó, mas só ele os ouve (graças às suas orelhas enormes). O prefeito (e no especial sessentista, um cientista curiosamente parecido com Seuss) sabe sobre Horton, mas ninguém acredita nele e só ele o ouve graças a algum equipamento ou coincidência.

A questão sobre evidências, crença, e o ataque a isso é o único tema que permeia toda a história, independente do lado. E claro o lance do trabalho em equipe, mas era muito sobre isso também.


E sim, os livros do Dr. podiam ter umas camadas de interpretação assim. Às vezes mais óbvias, como Yertle the Turtle criticando Hitler, e outras mais sutis como ter uma possível zoada aos comunistas em Cat in the Hat Comes Back. Esse livro também sugere que os pais das crianças são divorciados, aliás.

Mas não é nada exatamente explícito, a moral é salpicada durante a história e não tem nenhuma codificação sobre que lado é qual. Claro, a gente zoa que a cangurua é membro da ATEA, mas nada nela é como sei lá, os Na'vi em Avatar.


A animação é um pouco bisonha, mas mais na parte de cenário. Eles fazem um excelente trabalho em emular o estilo seussiano (como já foi provado cientificamente, animação é a única mídia possível pra adaptações do Dr.), mas alguma coisa pra mim soa estranha nas cenas na floresta. Talvez seja o excesso de elementos, de árvores, o estilo do Dr. sempre me foi mais limpo, e embora os elementos individuais sigam esse padrão clean, quando juntos... É.

Mas essa é minha única cata-piolhagem pra animação, todo o resto é incrivelmente cartunesca, funcional, e até o urubu que é mais detalhado que o resto dos personagens parece encaixar de alguma forma. Ele tem que soar ameaçador e provavelmente os caras reaproveitaram o modelo de Era do Gelo 2.

Ah sim, e teve a polêmica sequência inspirada por desenhos japoneses.


Eu... nem...


Digo... É bizarro, sim. No contexto faz sentido porque Horton tava imaginando a si mesmo como um herói salvador, mas...
...
...
Olha, o conceito da cena é ok, mas não tem como fazer ela funcionar desse jeito. A alternativa seria emular o estilo dos desenho do Superman ou algo assim, o que seria igualmente obnóxio e fora de lugar.
A animação da sequência é de fato bem feita, mas é uma parada tão inesperada que tu não tem tempo de reagir até que ela acabe e tu fique igual o palhaço Krusty.

Se eu dissesse que não me incomodou, eu taria mentindo... Mas...
...
Eu sei lá, é só bizarro, mas é o menor dos problemas em se tratando de adaptações Seussianas.

Falando em comédia, no geral ela soa um pouco off, mas funciona. Claro, ter Jim Carrey como protagonista é um plus enorme, e embora a personalidade do Horton nas outras versões seja BEM diferente da personalidade do Carrey... Ele consegue passar um personagem relativamente fiel ao original e ao mesmo tempo novo. Horton é um elefante leal e gente boa, mas também é absurdamente tímido e provavelmente não consegue dizer "não" quando alguém lhe pede um favor, a menos que esse favor vá contra uma promessa ou um princípio seu.

De fato, eu diria que Horton moldou muito do meu caráter.
Sério, essa frase sozinha construiu muito da minha filosofia quanto a promessas que eu faço.

a legenda que eu peguei era meio zoada,
embaixo era pra ser "And an elephant's faithful 100%"

Carrey consegue passar tanto a energia de um jovem elefante cartunesco como sua timidez e seus momentos sérios. É uma expansão válida no personagem.

Steve Carell também consegue fazer um prefeito que tenta ser um bom pai mas por qualquer motivo não consegue se conectar com seu filho mais velho, embora nunca mencionem o fato de que ser o filho mais velho de quase 100 irmãs menores tenha zoado a cabeça do maluco.

Digo, criança mais velha geralmente tende a ter ciúmes das mais novas, mas talvez a personalidade dele o tenha obrigado a se isolar cada vez mais de tudo e de todos. Bom, é um filme de 1h20, que que se pode fazer?

Enfim, eu ia falar sobre a comédia e acabei divagando. A comédia é muito tentativa-e-erro, algumas coisas funcionam, outras não. O bom é não ter nenhum humor grosseiro como nos outros filmes, o que é engraçado considerando que esse é o ÚNICO longa baseado em Dr. Seuss com censura G, todos os outros foram PG. G é basicamente "censura livre" e PG é "censura livre mas com a presença dos pais porque pode ter umas parada meio errada e tal"

Sim, esses são os termos técnicos, não me encha o saco.

Eu gosto daquela ouriça meio autista, ela é como um toque de nonsense sem ser irritante feito sei lá, os Minions. A cangurua cogitando seriamente em pagar o abutre com o próprio filho é cruel demais até pra ela, mas é uma piada que não fica por muito tempo.


Aliás, o Tom Cavalcante dublou o Prefeito, mas eu não achei nenhum trailer com uma porção boa de fala dele dublada e nem vídeo de bastidores, então não posso opinar quanto a isso. Mas só hoje eu descobri que ele também dublou o Lucky de Dr. Dolittle 1 e 2, e eu não sei como NUNCA tinha pensado nisso.
A partir do 3 quem dublou o cachorro foi o Nelson Machado, caso esteja se perguntando.


No geral, é a melhor adaptação seussiana. Expandiu a história com base (muito do que tem nos plotpoins do filme foi inspirado no curta com envolvimento do próprio autor), cortou as piadas adultas, se manteve como um produto pra crianças e com a mesma moral e temáticas complexas do livro sem esticar a baladeira.
Claro, tem algumas piadas sem graça ou que quase envelheceram mal (tipo referenciar o MySpace), mas ao menos são mais inofensivas comparadas aos outros filmes mais "edgy".

E então, porque os filmes subsequentes foram pra Universal, se conseguiu agradar público e crítica?

Bom, Chris Meledandri, produtor executivo do filme, saiu da Blue Sky e fundou a Illumination. A viúva Seuss aparentemente tinha mais proximidade com ele e disse que queria fazer O Lorax com ele. Ironicamente, os filmes Seussianos voltaram pra Universal e sabemos o resultado que deu: filmes visualmente bonitinhos mas que perdem totalmente o sentido original da história.

Sim, eu ainda não perdoei Lorax.

É um filme ok, adaptando um livro ok. A história no livro mesmo é previsível o suficiente pra que acabe sendo um pouco cansativa demais, mas ao menos tudo acaba funcionando. Eu pessoalmente gosto um pouco mais de Horton Choca um Ovo, mas isso sou eu mesmo.
Pro que temos, é bom demais.

...

Aliás, esse filme é da Disney agora.

...é. Disney com um filme baseado em Dr. Seuss e Peanuts. What a timeline.


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Sério, já viu o preço do salmão? Pois é.


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