O Remake de Rei Leão é uma Vergonha à sua Raça


Hoje eu vou ganhar todos os inimigos que eu não ganhei no artigo de Hermione e o Zé Colméia.

Eu não vou passar esse artigo te dizendo que o remake de Rei Leão é ruim. Eu sei disso, você sabe disso, e a torcida do Flamengo também sabe. Até você aí que gostou do filme, seja por atrelar à nostalgia ou simplesmente por estar acostumado a gostar de qualquer coisa recente que tenha saído, no fundo você SABE que é um filme ruim. Talvez demore a admitir isso, mas um dia a ficha cai.

Eu não preciso te dizer isso. Mas hoje eu vou lhe provar os motivos de todas as decisões desse filme serem erradas desde o momento que alguém disse "vamos fazer tudo em animação fotorrealista".

Este é um estudo de caso sobre como o remake de O Rei Leão é uma vergonha pra indústria do cinema e pra animação como arte.



Como vocês sabem, O Rei Leão de 1994 é um clássico absoluto. Até eu que não sou exatamente fã como outros longas do estúdio consigo reconhecer a qualidade e o esforço colocados na tela. É só que a história simplesmente não me traga tanto quanto sei lá, Tarzan, Aladdin ou Pequena Sereia. Mas os visuais são grandiosos, os personagens são simpáticos, as músicas são memoráveis, e as lições são excelentes.

Mas como é tradição dos remakes Disney pós-milênio (com raras exceções que são basicamente acidentes), nós precisamos despir o remake de todas as características que tornam o original um filme ao menos prazeroso de assistir, mas ao mesmo tempo dar todas as batidas narrativas e visuais com tecnologia nova pra que o público não se sinta enganado mesmo sendo ativamente ludibriado pelo marketing.

O que fazer?


Entra Jon Favreau. Jon já tem um currículo relativamente extenso na Casa do Rato, mesmo sem saber no momento. Digo, o primeiro trabalho como diretor foi pra um filme pra TV encomendado pela Touchstone Televison e... Fox Broadcasting.

Dirigiu o primeiro Homem de Ferro antes da aquisição da Marvel, e dirigiu o remake de Mogli. Em Rei Leão, ele usaria várias das técnicas fotorrealistas usadas em Mogli, que por si só já é um filme que embaça MUITO a linha entre live action e animação.

Pra cês terem uma idéia, tecnicamente o remake de Mogli poderia concorrer ao Oscar de Melhor Animação, por cumprir os requisitos de porcentagem de animação do filme, o que o colocaria no mesmo nível de Wall-E, em termos brutos. Wall-E tem BEM menos cenas live-action, mas a comparação técnica serve pra dar uma idéia do absurdo. A única coisa que ainda colocava o filme como um "live action" era o fato de se focar num protagonista humano e real interagindo com objetos e cenários (parcialmente) reais.

Rei Leão fez basicamente isso, só que sem Mogli, e durante muito tempo, ninguém sabia como classificar o filme (exceto a mim, que desde o anúncio previa que seria 100% animado; eles iam recontar o filme fielmente, mas sem usar animais reais devido a uma política recente de não usar animais silvestres em produções). Ele seguiria a trend de remakes live action, mas não seria live action. Mas ninguém na Disney se atrevia a classificar o remake, o que causava confusão em seu público.

Mas afinal, é um live-action ou animação?



Ato I - Torre de Babel


Eu vou ser bem técnico agora e focar na semântica dos termos. Pode parecer confuso e até um pouco chato, mas peço que tentem compreender, é importante.

O termo "animação" se refere ao ato de "dar vida a algo inanimado". Logo, você pode classificar como animação tanto um desenho do Pernalonga, o filme A Fuga das Galinhas, a propaganda de Listerine que a Pixar fez, ou os Muppets.
Sim, fantochismo é um tipo de animação tão válido quanto animação tradicional, 3D, ou stop-motion, mas por ser um estilo que normalmente se usa no mesmo meio live-action, é algo que tendemos a esquecer.

Live-action é, literalmente, "ação ao vivo". Pode ser um filme do Bruce Lee, um stand-up, ou qualquer coisa que seja filmada por uma câmera real focando em atores reais em cenários reais (o que incluiria fantochismo, mas esse é um meio de animação que se encaixa em live-action, talvez o único que o faça naturalmente).

O que se desenvolveu ao longo dos anos foram métodos de aplicar animação aos filmes live-action de forma a melhorar o real, de tornar realistas e verossímeis criaturas e situações que não seriam possíveis só com meios práticos. Por exemplo, Canção do Sul usa animação tradicional sobreposta a cenas live-action pra dar vida às histórias do Tio Remus; Labirinto usa fantoches pra mostrar as criaturas que habitam o mundo regido por David Bowie; e filmes de heróis recentes usam e abusam de animação 3D pra criar seus monstros, armaduras, explosões, ou até dar carisma pra Brie Larson, com resultados debatíveis.


Filmes live-action podem usar um ou mais elementos de animação misturados pra enfatizar o realismo do design de produção, como em Jurassic Park. A icônica cena do ataque do T-Rex foi feita usando animação 3D, fantoches animatrônicos, e stop-motion justapostos ou colaborando entre si. Quando técnicas de animação são usadas dentro de um filme live-action, são chamadas de VFX, um efeito visual. É algo que tenta enganar teus olhos, dizendo que aquilo é real.

Quando temos um filme híbrido, a coisa muda de figura. Uma Cilada para Roger Rabbit, Mary Poppins, Se Minha Cama Voasse são considerados filmes híbridos, mas porque a animação neles não tenta te enganar; o design dos personagens animados são propositalmente estilizados pra serem irreais e cartunescos. Se os pinguins e outros animais em Mary Poppins fossem feitos em stop-motion com um design realista, talvez não fosse tão considerado como híbrido. Ou fosse, porque a tecnologia dos anos 60 era quase artesanal e ia ficar bizarramente cartunesco. Enfim, divago.


Então, nessa lógica, tecnicamente qualquer filme ou produção de fantoche tradicional é híbrido? Não necessariamente, temos Dark Crystal que é feito exclusivamente com fantoches, e a própria Wikipedia classifica como "puppet-animated movie".

Sintetizando: todo efeito visual que se dedica a dar vida a algo inanimado é animação. Um fantoche, uma CG, stop-motion, por mais realista que seja, continua sendo animação. Kermit e os Skeksis são equivalentes a Mickey Mouse e o Charizard em Detetive Pikachu. O T-Rex não é menos animação do que o personagem de John Goodman em Os Dinossauros voltaram, seria como dizer que o Toughtful Lion de Storyteller é menos fantoche do que os leões de Reading with Lions, o que é absurdo.

Uma produção feita exclusivamente ou em maior parte disso, podem ser consideradas produções DE animação. Um pouco de live action no meio não altera, seria essencialmente inverter os valores de um filme comum. Wall-E e o remake de Mogli são basicamente um Jurassic Park ou Vingadores invertidos.

Então, porque a Disney, seu CEO Bob Iger, Jon Favreau, e os envolvidos tem tanta dificuldade em definir o estilo e técnica de Rei Leão 2019?

Marca.


Antes de mais nada, "animação" NÃO É UM GÊNERO. Eu vou repetir: ANIMAÇÃO. NÃO. É. UM. GÊNERO. Animação é uma mídia, uma mídia que pode contar diversos gêneros, como terror, comédia, romance, ficção científica, aventura, crime, etc. Assim como qualquer outra mídia como filmes, quadrinhos, jogos, pinturas, esculturas, música e livros.

O problema é que o estigma da animação no meio do público é um vai-e-vem tão grande que faz os relacionamentos amorosos do Archie parecerem Bodas de Carvalho. Lá nos primórdios do cinema, anos 20, 30, animação era algo pra todo mundo. De fato, talvez fosse algo mais pra adultos do que pra crianças, basta ver os curtas do Pica-Pau em seu início e comparar com o tempo que ele começou a ser exibido e produzido na TV. Dá pra notar só pela qualidade de animação, que deu uma decaída tremenda, tecnicamente falando, mas as histórias também foram duramente amansadas pra não "prejudicar as crianças".
Era uma novidade que estava em experimentação, por isso eles não pensavam em uma faixa etária específica e faziam cosas como Gertie a Dinossaura.

Lá nos anos 80 que foi começar esse estigma, com os desenhos que eram basicamente uma propaganda de brinquedos, como Transformers, My Little Pony, G.I. Joe e Rubik.
Sim teve um desenho sobre o Cubo Mágico, quanto menos falarmos disso melhor.


Enfim, só no final dos anos 80 e 90 que a Animação iria receber de novo o prestígio que tinha perdido, com a Renascença Disney. Siskel e Ebert trataram Bela e a Fera não como um filme pra crianças, mas como um filme como qualquer outro, do mesmo nível que os filmes "sérios" e "pra adultos" de sua época.

Claro que depois a indústria de animação iria cair de novo no velho estigma, ao encontrar fórmulas básicas e fáceis de vender. Parte da culpa vem de produções da Dream Works, Illumination, e em menor parcela, Disney. A Disney continua fazendo a mesma fórmula que já fazia (com uma ou outra diferença, mas assunto pra outro dia), mas a forma de marketear tem sido basicamente a mesma de suas concorrentes, especialmente a franquia Princesas.

Favreau, Iger, e a Disney não querem que Rei Leão 2019 seja comparado a Enrolados, Minions, ou Hotel Transilvânia. Pra eles, não é o mesmo público-alvo, eles querem pegar a demografia de Alice do Burton, Malévola, Hermione e Zé Colméia. Aquela geração que era criança nos anos 90 e 2000 e cresceu com os filmes originais e acha que os remakes são reimaginações mais edgy, sombrias, e "maduras" porque são feitas com atores conhecidos e visuais realisticamente detalhados.

Claro, não são todos, mas quando se estuda demografia e público-alvo é o tipo de preconceito que precisa vir no pacote. Às vezes o público que vai ver Minions é o mesmo que vai ver Malévola e isso é ok.
Exceto que se você gostar de Minions e Malévola você é uma ameaça pública em potencial e provavelmente deveria procurar um psicólogo, psiquiatra, exorcista ou o Sílvio Santos.

Então, pra contornar isso, eles aderiram a tática muito usada por gente que não quer treta e só quer receber o cheque no final do mês sem muitos problemas: se fazer de doido e fingir demência.


Eles nunca disseram exatamente o que era, e tal qual a controvérsia de Kimba em 94, era comum o pessoal da equipe dizer que era um "live-action", mesmo sem ser. Cada frame do filme foi criado num computador, pelas mãos de artistas, e existe apenas num mundo virtual. A diferença é que Jon e sua equipe podiam usar capacetes de realidade virtual e passear pelo cenário, ajeitando o que precisava, e então jogar as animações dos personagens no cenário e orientar melhor e com qualidade absurda em tempo real, já que foi feito numa engine de jogo.
Praticamente o Tá Dando Onda 2.0, exceto que Tá Dando Onda era bom e divertido e memorável.

Raios, Dinossauro é mais live-action que o remake de Rei Leão, porque ele de fato tem cenários reais com personagens digitais, e ainda assim absolutamente NINGUÉM considera Dinossauro sequer um filme híbrido.

Então, uma vez que eles basicamente refizeram O Rei Leão em animação, é só mais do mesmo. Mas como já conhecemos o modus operandi de remakes e sequels Disney... é também menos.

Esse filme consegue ser PIOR que Hermione e Zé Colméia. Talvez não tenha me enfurecido tanto, mas ele é crítica e empiricamente pior.



Ato II - Abandonai toda a vossa esperança, ó vós que entrais aqui


Antes de mais nada, deixar registrado que a nova Vinheta do Castelo Disney tá mó daora. É 3D, mas feito pra parecer 2D, o que ironicamente me deixa esperançoso pro futuro (porque eu pessoalmente detesto a vinheta atual, sei lá porque), mas também me deixa irritado porque parece o tipo de provocação feita em The Cat in the Hat de 2003.

O remake consegue repetir o exato mesmo feito de Hermione e Zé Colméia, mas com algumas diferenças básicas. Enquanto o filme da Leite Moça tomava todas as decisões argumentais e visuais possíveis pra prejudicar a história (mesmo desconsiderando o original), ainda era uma produção em outra mídia e...

...

Eu tentei, nem esse filme conseguiu me fazer elogiar o remake de Bela e a Fera. Mas uh... Mesmo pra um filme ruim, o design de produção é conceitualmente bonito. Pegou as influências certas e... É...


...Ok, eu tou me perdendo aqui. Meu ponto é que remakes como Bela e a Fera, Aladdin, Alice e até Malévola conseguem dar algumas voltas pra que o produto final não destoe tanto de si, no sentido de que já tivemos outros live-actions baseados nessas mesmas histórias no decorrer dos anos, então os produtores podem usá-las de inspiração pra montar seu filme. Não quer dizer que eles consigam, mas em casos como Malévola e Alice (que eu sustento, são tão ruins quanto comer aquele resto do almoço que fica na pia da cozinha) eles tentaram fazer algo diferente. Mudaram o tom da história e conseguem ser mais ou menos uma adaptação da mesma história que gerou os longas animados originais.

Bela e a Fera e Aladdin tentaram seguir os filmes originais mais à risca, mas só o que tomou mais liberdades pra criar o próprio universo sem se ferir se saiu melhor, enquanto o Zé Colméia criou TANTO subplot desnecessário que acabou criando mais buracos argumentais que aquela colcha de retalhos de 1945 que a tua avó guarda.

Rei Leão tenta seguir o original AINDA MAIS à risca do que Hermione e Zé Colméia, e falha miseravelmente.



O maior trunfo do filme também parece ser o seu maior problema. Qualquer um com mais de dois neurônios e uma visão eficiente pode constatar que o visual desse filme é SURREAL de tão fotorrealista. Sério, eles fazem os testes primordiais de Procurando Nemo parecerem primitivos.
Se tu tiver o DVD duplo de Procurando Nemo, os documentários mostram que a equipe pegou filmagens reais de peixes e oceano e reproduziu em CG e ficaram indistinguíveis. Rei Leão faz a mesma coisa, só que durante todo o filme.

O problema é que eles provavelmente tavam muito empolgados com a tecnologia e muito adiantados no projeto e ignoraram o maior problema: falta de emoção.


Existe um motivo pelos quais exageramos feições humanas em animais, objetos, e na Kristen Stewart: é a tentativa de torná-los mais fáceis e simpáticos a nós. É um filme feito por humanos para humanos então humanos deviam ser capazes de ler emoções básicas em seus personagens.

Favreau ignora completamente essas convenções naturais e se confia na comunicação corporal de seus personagens, enquanto seus rosto continuam com tanta expressão emocional quanto um Monza 1.6 usado movido a álcool.

Os momentos onde tu pode ver alguma expressão humana nos personagens são tão poucos que quando acontecem duram por alguns frames e tu logo nota a diferença. É ridículo, é imbecil, é prejudicial pro filme. Eu não consigo sentir absolutamente NADA por uma criatura com a qual eu não consigo sentir que tá viva ou que tem emoções e pensamentos humanos.

Ok, vamos fazer um teste. Responda rápido: que emoção é essa?


Se você respondeu "briga", "raiva", "caganeira", ou "eu não acredito que não é margarina", você poderia estar errado e certo ao mesmo tempo. Praticamente o Leão de Schrödinger.

Ok, e agora me diga rápido, que emoção é essa?


Só há uma resposta clara e certa, não importa a variação da sua resposta, provavelmente vai estar no caminho certo.
É o mesmo momento na narrativa, mas só conseguimos entender totalmente um deles, e ao mesmo tempo simpatizar com o personagem.

Um dos motivos que gostamos de Simba e o achamos adorável são os grandes olhos expressivos. Podemos ler pelas emoções que ele é uma criança e tem reações exageradas tal qual uma criança real teria; mas como é um desenho, os animadores podem exagerar algumas coisas pra tornar ainda mais interessante de assistir. É um dos motivos que comediantes como Jim Carrey e Tim Curry são tão divertidos de ver, eles conseguem mover a cara e manipular a voz de uma maneira tão surreal pros nossos padrões que até caracterizamos como cartunesco.

E não só isso, mas eles se confiam no design de personagem que... É praticamente inexistente? Simba, Mufasa, Nala e Sarabi são facilmente intercambiáveis, sem nada que os diferencie muito. Eu não vou fazer o lance de comparar os posteres sem os nomes aqui porque você já deve ter visto em algum lugar. Caso não, faça o experimento você mesmo, também funciona com Simba e Nala pivetes.

O único personagem que parece ter tido algum esforço foi Scar, que tem tons de cinza, uma cicatriz no rosto e um formato de rosto alongado. O resto se parecem exatamente como os animais originais, o que é um problema ainda maior.
Quando o Toughtful Lion de Jim Henson parece mais expressivo que os leões do filme que gastou o equivalente do PIB da Bahia, então temos um problema.

Sim, eu queria uma desculpa pra usar essa foto aqui,
mas meu argumento se sustenta.
Zazu parece ter menos personalidade que um pássaro real, e a expressão corporal não consegue de jeito nenhum acompanhar a voz de John Oliver. De fato, toda vez que eu ouvia Zazu eu esperava ele soltar alguma piada política pseudo-intelectual feita de frases manjadas mas que fazem sucesso no tumblr.

Timão é o que chega mais próximo de se salvar, mas porque suricates são naturalmente engraçados e são o mais próximos de um visual humano que temos. Ainda assim não é suficiente pra de fato ter alguma emoção e de perto é mais assustador que fofinho. Pumba parece um javali real, o que é uma decisão tão inteligente quanto fazer o Sonic como um ouriço real e marrom.
Eu juro, a direção criativa do Pumba parece ter sido "imagina um milho cabeludo coberto de fezes", ele é tão feio e nojento de se olhar que me dá náusea.


"Ai Kopão mas é assim mesmo eles escolheram o estilo fotorrealista então os animais são meio feios e inexpressivos", EXATAMENTE O MEU PONTO, possível voz do meu subconsciente que eu escuto desde 2011 e provavelmente deveria consultar um psiquiatra pra te arrancar da minha cabeça. É uma decisão fundamentalmente imbecil, porque limita os artistas trabalhando e joga contra a própria história.

Seria como fazer um remake animado de Newsies, um filme onde o balé e sapateado são partes primordiais da experiência. Fica de boas numa peça (até mais impressionante, de fato), mas numa animação ia ser "meh". Simplesmente não iria ser traduzido da mesma forma.


E claro, como se isso não fosse suficiente, o maior crime desse filme foi tirar TODAS AS CORES do original. I Just Can't Wait to be King? Aquela sequência memorável que usava cores fantásticas e vibrantes com sequências fantasiosas que demonstravam visualmente a excitação e sonhos de uma criança sobre seu grandioso futuro? Agora é só Simba e Nala correndo pela savana e os bichos seguindo eles. É.

Ou que tal Can You Feel the Love Tonight, onde as cores e iluminação eram primordiais pra criar o clima romântico entre Simba e Nala? Foi-simbora, e agora a sequência acontece DE DIA.

Ok mas e Be Prepared? Debativelmente a melhor música e melhor sequência do filme original, sombria, poderosa, grandiosa e com um storyboard lindo que te faz ver e rever só pra apreciar melhor todas as nuances? A Disney tirou porque a referência aos nazistas é "PoLiTiCaMeNtE InCoRrEtO". Quando a informação vazou, os fãs entraram em fúria e os produtores fizeram uma versão em cima das coxas com tanta animação e empolgação que parece que foi orquestrada pelo Dj Chrissy Chris num asilo de idosos.
Scar basicamente não canta, ele recita parte da letra enquanto dá voltas na caverna. É patético.


E como é de praxe, precisamos de uma música nova, totalmente do zero porque precisamos daquela música que destoa de todas as outras. Zé Colméia canta Evermore, Jasmine canta Speechles, e Beyoncé canta Spirit, que dura menos tempo do que deveria e liga nada a lugar nenhum.

Deve ter alguma cláusula no contrato dos produtores desses remakes pra botar esse tipo de música, mas aqui é ainda pior porque não representa muita coisa, é uma idéia cíclica, e o filme poderia ter sobrevivido muito bem sem isso. Diga o que quiser de Evermore e Speechless, por mais esquecíveis e medíocres e destoantes que fossem, ao menos fechavam ou davam alguma continuidade a arcos narrativos.

Spirit nem pra isso serve, o filme literalmente se lembra que tem a Beyoncé e inventa alguma coisa de última hora pra jogar no meio e se dá por acabado.

E o resto das músicas...? Eh. Fora Be Prepared que é a coisa mais vergonhosa que a Disney já produziu desde Corcunda de Notre Dame 2 e Spirit que vale menos que a bala Pips que eu comi hoje, o resto tá aceitável. Não faria diferença se existisse ou não, eles não cantam melhor nem pior que outras versões, elas meramente existem. Ou pelo menos eu não consegui prestar atenção na música quando os personagens que as cantam parecem ter menos direção do que uma peça escolar.
De fato, esse vídeo de Aladdin Jr. tem mais paixão e energia que todo esse filme, vá ver esse vídeo no lugar.


Só pra não terminar tão pessimista, a única coisa que eu gostei realmente foram os diálogos de Timão e Pumba. Se fosse em outro filme eu ia revirar os olhos por serem diálogos tão metalinguísticos mas ao mesmo tempo tão rasos que não gerariam mais que um sopro de nariz. Mas como o resto do filme fracassa em me dar qualquer tipo de reação além de "meh" ou "ah não velho", piadas medíocres de quarta parede são uma das poucas e esporádicas coisas que eu realmente gostei do filme.

Todo o resto, pode jogar no lixo. Sério mesmo, não tem ABSOLUTAMENTE NADA de valor aqui.

É como se alguém tivesse se alimentado de uma refeição balanceada, de carne, verdura, cereais, linda, colorida, atraente, com um suquinho natural pra ajudar a descer. E ainda teve uma sobremesa supersupimpa: bolo de chocolate com M&M's, lindo e satisfatório.
Aí no meio da digestão vem Jon Favreau, te dá um soco na boca do estômago, e tu acaba vomitando o que antes era uma comida atraente e nutritiva em uma massa amorfa de cores mortas e cheiro desagradável.

Acho que a analogia ficou bem óbvia.


E se vocês não querem ouvir o blogueiro depressivo com muito tempo livre nas mãos, ouçam o que os animadores do original dizem. Até aqueles que elogiam a técnica ou outro aspecto reconhecem que o filme não tem emoção nos personagens, e os que não gostaram se sentem pessoalmente machucados.
Tanto esforço, sangue, suor e lágrimas pra fazer um filme como O Rei Leão ser o que é, pra 20 anos depois vir um bando de mameluco dizendo "vamos consertar esse filme" e acabam sugando toda a vida e emoção do original.

Pois é.

Em tempo, a cena da morte do Mufasa nesse filme é uma das paradas mais involuntariamente engraçadas que eu já vi e eu literalmente não consigo explicar o motivo.


Ato III - Saudades do que a gente não viveu ainda

Na imagem: animadores do longa original
ouvindo a notícia do remake.
Não era necessário que a Disney fizesse esse filme. Raio, o método de lucrar com filmes clássicos que não precisam serem "consertados" é simplesmente reexibir eles na telona, prática que se perdeu há muito tempo, mas com um marketing bom poderiam convencer o público a ir.

Exaltem as qualidades de ir pro cinema, Imax, telona, som surround. Imagina ouvir Circle of Life numa experiência semelhante à da Broadway, que literalmente te força a virar a cabeça pra acompanhar os cantores. Sem é claro, ter essa parte porque limites da mídia, mas ainda assim só o som vindo dos seus arredores deveria ser suficiente. E se eles conseguem convencer o público a ver Toy Story 4, eles conseguem QUALQUER COISA.

Exceto talvez ver Oz The Great and Powerful e o remake de Pete's Dragon.
E Solo, mas aí foram outros 500.


Mas digamos que a Disney mandou um memorando pros produtores e obrigou os caras a fazerem um remake de Rei Leão, caso contrário iriam perder os empregos. Eles sabem que não tem como perder essa, se tão mandando fazer remake desse filme, é porque sabem que a bilheteria vai ser boa e os executivos vão poder comprar uma TV nova pro banheiro e enforcar crianças no Lolita Express. Win/win. Então, ao menos faremos algo diferente.


Ao invés de ser animais, serão humanos. Tribos africanas, pra ser mais preciso. Tribos representadas por animais guardiões. Temos a tribo dos leões, que dominam sobre as outras por serem os mais fortes; a tribo dos elefantes por que... sabem técnicas de irrigação e colheita? Sei lá, todas as tribos vão ter uma função dentro da sociedade, e a partir daí poderíamos ter as mesmas batidas narrativas do Rei Leão original, mas com a liberdade que o conceito-base nos dá.

É uma idéia boa? Ruim? Não sei, mas tem potencial e já é diferente, o que deveria ser convincente o suficiente pra receber um sinal verde. As técnicas de animais fotorrealistas poderiam ser utilizadas ainda, porque... Bom, humanos precisam comer e caçar. Animais não seriam falta aqui.

Se bem que até se a Disney lançasse uma gravação do musical da Broadway num Samsung Galaxy Y seria melhor do que o filme que recebemos.
Não, sério, olha que parada sensacional a versão da Broadway. Não só musicalmente, mas como eles usam fantoches e as possibilidades que o meio teatral oferece, de passear ao redor da platéia. O fato de tar em alemão até passa desapercebido.


Se tiverem interesse, vejam outros vídeos sobre o musical da Broadway, que terão uma noção mais exata do que eles fazem nos palcos. É sensacional, e eu ADORARIA ver isso adaptado pra um filme com orçamento decente.

Agora, se minha teoria estiver certa e eles só fizeram esse filme pra testar as tecnologias, a Disney deu uma bola fora do tamanho do rio Amazonas. Movimento certo do ponto de vista business, mas Bob Iger parece mais inclinado a agradar os acionistas do que os fãs ultimamente.

Então... Existe uma série em quadrinhos chamada Mouse Guard, que rendeu até um RPG de mesa. A Fox tava trabalhando numa adaptação pra filme, e tava até avançado no projeto, tendo gastado uns 20 milhões já.

Esse é o vídeo-teste feito numa engine de jogo, que serve pra mostra mais como o filme deveria se sentir do que o produto final.


Olha que coisa espetacular. Claro que os modelos e animações ainda precisam de refino, mas o conceito de escalas, lutas e construção de mundo já tá num rumo muito bom e poderia se beneficiar da tecnologia e talvez da direção de Jon Favreau, que embora eu não conheça muito do trabalho inicial dele, eu sei que fez Um Elfo em Nova York e Zathura, então eu sei ele é um diretor competente.

E o que a Disney fez quando comprou a Fox? Cancelou o projeto.

Simples assim.

É.

Tipo Star Wars 1313, sim.



Existiam N maneiras de fazer o que eles almejavam com Rei Leão, mas foram pelo caminho que provavelmente irritaria mais gente. Eu sustento, a estratégia de Bob Iger é fazer com que o público comece a comparar o remake com o original só pra perceber como o original é superior. Criar um desequilíbrio na Força pra te fazer voltar ao original. Ele sabe que esses remakes vão ser tão descartáveis quanto as sequels que seu mentor, Michael Eisner, produziu no final de sua gestão.

Ninguém lembra que existiu Cinderela 2, ou O Mundo Encantado de Bela, ou Tarzan 2, ou Pequena Sereia 3. Da mesma forma que daqui a 10 anos ninguém vai lembrar de Malévola, Hermione e Zé Colméia, e muito menos de Pete's Dragon, mas porque o filme original já não é tão lembrado assim (o que é um crime, porque é muito bom; dá uma procurada pra baixar, Netflix tirou faz um tempo).

Prova disso é que só lembramos que Alice do Burton existiu porque teve sequel há poucos anos, e prova mais forte ainda é que praticamente TODO material promocional (caderno, lancheira, boneco, camisa, etc) de Rei Leão 2019 foi feito usando o design original. Pouca coisa tem com os novos designs, porque eles são surpreendentemente genéricos e poderiam muito bem nem ter a marca Disney que não faria diferença nenhuma.

O mais risível foi quando saiu um álbum de figurinhas e a ÚNICA referência ao filme novo era o pôster, o resto era tudo do desenho original.

Se botasse a logo do Animal Kingdom em
metade desses bonecos ia cair como uma luva.



Conclusão: Não sejais gado

Marketing de cultura pop tem conseguido algo fascinante: empurrar coisa ruim goela abaixo de seu público e ainda te fazer gostar. Precisamos parar com isso. Precisamos ser mais críticos. Remakes de filmes que absolutamente ninguém pediu ou tem motivo pra existir; sequências desnecessárias que acabam machucando tudo que a franquia construiu com suor, sacrifício e tempo; ou simplesmente o estúdio tem ofendido o público por politicagem pra agradar a uma minoria que não consome seus produtos.

PAREM de dar dinheiro pra esse pessoal. Desenvolvam um raio de senso crítico. Se tu tá indo ver um filme só pra falar mal dele, NÃO VÁ. Eu fiz isso uma vez com o remake de Bela e a Fera, mas fui mais de companhia pra minha mãe. Eu SABIA que ia ser ruim, mas fui assim mesmo.
Fui ver Aladdin, mas porque todo o material promocional me convenceu de que eles teriam alguma novidade nessa interpretação, e a trilha sonora lançada no YouTube só confirmou minhas suspeitas. Mesma coisa com Retorno de Mary Poppins.

Eu quase vi Dumbo no cinema, e foi um alívio quando eu vi torrenteado no computador, por não ter gasto dinheiro nem tempo com esse filme no cinema. O mesmo com Toy Story 4 e Rei Leão, e assim vai ser com Malévola 2. Ao mesmo tempo, me senti meio mal por não ter ido ver Power Rangers e Detetive Pikachu nos cinemas, que são filmes que eu senti que realmente mereceriam ser vistos na tela grande.


Eu não sou contra remakes. Raio, nem remakes de filmes praticamente perfeitos como Bela e a Fera, Rei Leão e Mary Poppins. Mas a única coisa que eu exijo é que tragam algo novo. Pode ser bom ou ruim, mas façam algo novo ou diferente. Alice do Burton é uma desgraça colossal, mas ao menos os visuais e história são diferentes o suficiente pra que seja algo próprio. Pete's Dragon faz uma parada surreal ao adaptar as mesmas batidas narrativas do filme original numa história COMPLETAMENTE DIFERENTE. Sério, assistam os dois filmes um atrás do outro e verão o que eu digo, enquanto não faço um artigo sobre ele.

Rei Leão 2019 é um filme de animação pra pessoas que crêem que animação é coisa de criança. (De novo, abstraiam o conceito; tou falando mais sobre demografia do que gente em específico. Tu pode gostar do Rei Leão 2019 e ainda considerar Animação como uma forma de alta arte)

Consegue ser mais ofensivo que Hermione e Zé Colméia, que é baseado no filme que teve tanto prestígio em seu tempo que CRIOU a categoria de Melhor Animação. Bela e a Fera basicamente concorreu de igual pra igual com O Silêncio dos Inocentes, e de repente a Disney diz "não mas AGORA o live-action vai ser uma versão mais séria e madura", e repetem o discurso com Rei Leão.

Ah mas vão se lascar, na moral. Essa prática é um insulto à inteligência. E sim, eu boto Aladdin e Pete's Dragon no meio, não é porque foram filmes legitimamente bons que a intenção não tenha sido a mesma.


Aprendam a notar quando as grandes empresas querem empurrar algo forçado e desnecessário. Aprendam a dizer "não". Não é só porque é uma propriedade que tu amava na infância que te obriga a ver uma versão nova que é basicamente um remendo de luxo.

Quando a bilheteria de Alice Através do Espelho foi notavelmente baixa, eu achei que houvesse esperança de que o público em geral tivesse começado a rejeitar esse tipo de história. Mas aqui estamos, com Rei Leão 2019 sendo a maior bilheteria de animação, superando tanto o filme original quanto o Rei Leão de nossa época, Frozen.

O Ciclo Sem Fim precisa parar. Não sejam gado. Não engulam qualquer coisa. Valorizem esforço real.

Boa noite.

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Ok, eu tava procurando alguma coisa interessante na Amazon pra sugerir pra esse artigo, mas tem surpreendentemente pouca coisa de Rei Leão. Mas eu achei o livro com narração em CD pra ouvir a história. Eu tinha um desses quando moleque de Toy Story 2 e Tigrão O Filme, e eu basicamente aprendi a ler com esses livros. É ótimo pra crianças em fase de aprendizado e é uma relíquia interessante pra se guardar.

Mas também achei os quadrinhos de Kimba, cuja polêmica expliquei na retrospectiva Disney então não vou me repetir aqui. Só vá atrás porque é algo que vale a pena guardar.

Lembrando que comprando por esses links cê me ajuda a continuar o trabalho aqui, então se tiver interesse e puder, por favor o faça, o Joshua tá com fome já.



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  Esse post foi feito com o apoio do padrim João Carlos. Caso queira contribuir com doações pro blog, dá um pulo lá no Padrim, que cê vai poder dar pitaco nos artigos futuros, ler artigos assim que forem terminados, e mimos aleatórios na medida do possível.
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Também dê uma olhada nos livros originais do grupo SRT, que podem ser lidos usando o Kindle Unlimited, que é basicamente uma Netflix de e-books. Tu paga uma mensalidade e pode ler QUANTOS LIVROS QUISER, no kindle, tablet, celular e computador.
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Ou se tu preferir filmes e séries, dá uma chance pra Amazon Prime, que não só tem um catálogo diferente da Netflix, como tem uma pancada de outros benefícios, tipo frete grátis, assinatura de revistas, brinde na Twitch, etc.

Inclusive o Prime Gaming dá jogo de graça todo mês, pra ficar na tua biblioteca mesmo. Vez ou outra aparece umas pérola tipo arcade da SNK, point and click da LucasArts e sei lá, o jogo de Dark Crystal, além dos pacotes pra uma PANCADA de jogo online.

Sério, faz o teste gratuito aí clicando na imagem abaixo, talvez tu encontre algo que não tenha na Netflix, ou Disney+, ou wathever que te interesse. Tem filmes clássicos também, tipo os da Pantera Cor-de-Rosa no MGM.
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