O Legado de Tio Walt - Parte 10: Estabilidade
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A Disney Animation havia acabado de fechar uma Era com Tarzan, sabendo ou não. Enquanto a companhia crescia e a divisão de parques estendia suas ramificações até a Europa e Michael Eisner aproveitava a calmaria antes da tempestade em sua carreira, Roy Disney tinha outros planos pro departamento de animação.
Na verdade, a companhia inteira tava passando por mudanças, e a palavra-chave a partir de agora vai ser "experimental". Cês vão ver.
No meio da febre dos VHS onde a Disney passou a relançar seus clássicos pro home video e ainda aproveitava um bom status financeiro e crítico dos longas animados, Roy notou que as fitas de Fantasia eram bastante populares, chegando a vender mais de 14 milhões de cópias só nos EUA, um feito absurdo até pros dias do DVD.
Havia um público. Haviam os meios. E havia Roy E. Disney, the man with a plan.
Ele mandou um recado em tom jocoso pro Michael Eisner: "Eae man kkkk então dá pra fazer um Fantasia novo só com o lucro dos VHS do original imagina que loco"
Eisner respondeu com "vai lá então".
Fantasia 2000 (1999)
Lá em meados de 91, Roy começou a juntar gente e idéias pra fazer uma sequência digna de Fantasia. Outras tentativas de continuar o conceito foram feitas, como Make Mine Music e Melody Time, que até então eram considerados sucessores espirituais do longa. Nos anos 80 houve outra tentativa chamada Musicana, mas deu em nada.
Mas agora parecia ser o momento mais apropriado, dado os números de vendas das fitas. Roy pegou o maestro e consultor musical James Levine, que na época parecia a versão culta do Richard Simmons. Não só isso, mas Roy queria manter o conceito de "filme vivo" de seu tio.
A idéia era deixar metade do Fantasia original, com segmentos novos intercalando os antigos. Logo no começo se viu que isso não funcionaria e provavelmente o público pensaria "ok pra que eu vou ver isso no cinema se eu literalmente acabei de comprar um VHS com esses desenho?". Não faria sentido.
Foram cortando os segmentos antigos e substituindo pelos novos, exceto O Aprendiz de Feiticeiro, porque essa iconografia do Mickey era basicamente o "rosto" do filme, a cola que unia todos os segmentos, de uma forma ou de outra.
Minhas memórias quanto a esse filme são meio... zoadas. Eu não vi o filme quando moleque, mas eu lembro de ter uma revista Recreio sobre o filme e se não fosse meu estado mental recente que teve que criar uma personificação da minha consciência pra eu não surtar, eu provavelmente poderia te citar todos os textos e descrever todas as imagens da matéria.
Fora isso, tem a abertura do VHS de Toy Story 2 que um amigo tinha, que eu vi tantas vezes que eu também conseguiria te descrever com detalhes a maioria dos trailers. Exceto o que não fosse de Fantasia 2000 e Dinossauro e o Sebastião falando "I'm too old for this!". Só quando eu revi que eu lembrei do trailer de Tigrão e 102 Dálmatas.
Então... Eu meio que tenho mas ao mesmo tempo não tenho uma memória afetiva em relação a esse filme. Mas assim como quase todos os clássicos do estúdio, a qualidade vai bem além da nostalgia.
O filme começa com a Quinta Sinfonia de Beethoven, também conhecido como "música de surpresa" em conversas informais, que assim como Fantasia original, traz uma animação abstrata. Embora ainda tente contar uma narrativa, ainda é algo guiado pela emoção da música e as imagens continuam sendo coisas com vaga semelhança a algo conhecido, como bolhas, nuvens, e borboletas de Doritos.
E é uma animação soberbamente criativa. Não só a música casa com as imagens, ora em batidas ora em emoção, mas... Veja bem, quando se tem uma luz vinda do céu que se transforma em água quando bate nas nuvens, é porque tu tem algo extremamente criativo em mãos.
Ou que alguém cheirou pó de gelatina, sei lá.
Ou que alguém cheirou pó de gelatina, sei lá.
Ainda assim é espetacular, algo que realmente não dá pra descerver em palavras e precisa ser apreciado. Aliás, esse curta é um casamento perfeito entre animação tradicional e digital: os cenários são pintados a mão, as borboletas são animadas à mão mas servem de guia pro computador aperfeiçoar e até criar os enxames. Ele te faz se questionar constantemente se o que cê tá vendo é tradicional ou computador e na maioria dos casos, são os dois. (Algo parecido foi usado na cena do estouro da manada em Rei Leão).
Em seguida, temos Pines of Rome, o famigerado curta das baleias voadoras. Esse segmento é espetacular, de verdade. Assim como Toy Story, a computação gráfica foi projetada pra que disfarçasse a falta de qualidade gráfica e aperfeiçoamento da técnica digital. A idéia original surgiu nos animadores fazendo rascunhos enquanto ouviam a música, sim, mas o fato de tudo acontecer de noite, com objetos geométricos como blocos de gelo e baleias que ficam no meio termo entre cartunescas e verossímeis ajuda muito.
Digo, elas são bem mais redondas e com texturas menos detalhadas do que deveriam ser, mas ainda são simpáticas e os olhos são animados em 2D, porque os caras ainda não conseguiam fazer olhos realistas o suficiente. Fora que dá mais personalidade pras baleias.
Aliás, nos anos 2000 as baleias jubarte tavam em extinção ou algo assim? Eu lembro de algum vídeo sobre baleias jubarte numa edição do CD Expert Kids, na mesma época do lançamento desse filme.
Aliás, nos anos 2000 as baleias jubarte tavam em extinção ou algo assim? Eu lembro de algum vídeo sobre baleias jubarte numa edição do CD Expert Kids, na mesma época do lançamento desse filme.
É um curta adorável, mas também GIGANTESCO. GRANDIOSO. GLORIOSO. Assim como a música, ele vai crescendo, escalando, temos um momento pequeno, e depois tudo cresce e enche os olhos e... eu só queria poder ver tudo isso na tela de cinema em IMAX, deve ser uma experiência ESPETACULAR.
É provavelmente o meu curta favorito dessa leva, por ser um dos poucos que me faz ter literais arrepios toda vez que eu vejo e me faz acreditar que esse curta sozinho foi o ápice da raça humana como um todo.
Fora a Jennifer Connelly nos anos 90.
Rhapsody in Blue é mais focado em contar uma história (uma rruma, na verdade) do que a maioria dos outros curtas, que sim, contam uma história mas mais guiada pelos sentimentos da música. Aqui a música ainda guia as batidas visuais, mas a narrativa em três atos é mais notável.
Com influências mais modernas tanto na música quanto nos visuais, Rhapsody usa um jazz revestido de música clássica... seja lá o que isso significa. E o estilo gráfico de Al Hirshfeld, que fazia ilustrações de celebridades. Estilo esse que inspirou fortemente o Gênio de Aladdin, animado por Eric Goldberg. O próprio Eric também produziu e supervisionou o curta, e ainda mostrou pro Al em seu aniversário de 96 anos. De fato, um trabalho de paixão do cara, e dá pra notar o resultado na tela.
A animação é esplêndida, incrivelmente cartunesca e com muita personalidade e ainda mantendo o aspecto físico dos personagens. Tem um momento em que vemos um pianista tocando ao som da música, e não só as teclas batem com as notas como os dedos são... Raio, é espetacular. É rápido mas não quebra o estilo da arte.
E cada personagem é identificável e com motivações simpáticas. Tem o operário que quer ser baterista de jazz; o cara casado com uma mulher mandona e irritante; a guria que tem muitas atividades extras durante o dia e não passa tempo com os pais; e o desempregado de bom coração.
É interessante como ele pega temas universais e atemporais e consegue trabalhar eles de uma forma tão leve e simples, mas eficaz. Os personagens são divertidos, a forma que as histórias se entrelaçam são divertidas, e a música dá o tom visual da narrativa, sem nunca necessariamente precisar ritimar os visuais com as batidas da música.
É o tipo de coisa que dá gosto de rever, é uma avalanche sensorial, mas divertida e sem se tornar cansativo.
Also, essa tomada do final levou TANTO tempo pra ser renderizada que causou uns atrasos na schedule de Tarzan.
Tin Soldier é uma história que eu só conhecia através do CD de historinha do Sílvio Santos que meu primo tinha. Era uma versão nova, não a dos anos 70, a da capa aí:
E eu não consigo encontrar em CANTO NENHUM... do YouTube, porque eu não vou gastar dinheiro com algo que não é mais que uma novelty nostálgica.
Enfim, caso não conheçam, a história conta sobre um soldadinho de chumbo que por algum motivo tem uma perna só. Ele se apaixona pela bailarina da caixinha de música (ou castelo de música, sei lá se isso realmente existiu), mas o Jack-In-The-Box quer tomar a boneca pra si. O soldadinho a defende, e o palhaço o joga pela janela, o que força o herói a uma jornada de volta pra casa guiada unicamente pelas Leis da Conveniência Universal.
Enfim, caso não conheçam, a história conta sobre um soldadinho de chumbo que por algum motivo tem uma perna só. Ele se apaixona pela bailarina da caixinha de música (ou castelo de música, sei lá se isso realmente existiu), mas o Jack-In-The-Box quer tomar a boneca pra si. O soldadinho a defende, e o palhaço o joga pela janela, o que força o herói a uma jornada de volta pra casa guiada unicamente pelas Leis da Conveniência Universal.
Curiosamente, esse curta em 3D sobre brinquedos foi produzido antes de Toy Story, o que é mais característica do estágio primitivo do 3D na época do que roubo de idéias/conceito. Outro fato curioso é que já haviam planos de adaptar a história pro primeiro Fantasia. Artes conceituais foram feitas e depois publicadas em um livro contando a história de Andersen. Um dos animadores leu o livro enquanto ouvia a música e as duas coisas pareciam ser um encaixe perfeito.
Aliás, foi feito bem depois do curta das baleias, a essa altura já dava pra animar olhos de maneira que não fosse zoado.
Outra coisa que eu gosto é que eles ainda usam o 2D pra outras coisas, como os ratos no esgoto e os humanos. É uma mistura interessante e experimental, mas os personagens principais são em 3D.
É um curta bonitinho e divertido de ver.
Depois temos o final de Carnaval dos Bichos (Carnival of the Animals), outro curta chefiado por Goldberg. De fato, Eric sozinho animou esse segmento, o que é mais um motivo que me faz ter Mad Respect™ pelo cara. É um segmento energético, divertido, com personalidade e com as imagens ritimadas pela música, o que é sempre um prazer de ver.
Talvez seja por isso que jogos de ritmo façam/fizeram tanto sucesso durante um tempo, movimentos sincronizados com música rápida sempre é interessante e divertido de ver, e aqui não é diferente.
Depois eles mostram Aprendiz de Feiticeiro, único curta que sobreviveu do original.
Já falei sobre ele antes então... é.
Já falei sobre ele antes então... é.
Pompa e Circunstância. Esse é outro que, assim como Pines of Rome, é grandioso e espetacular. O curta reconta a história do Dilúvio, e era pra ser um curta meio cômico, com os animais passando por cima de Noé e ele tendo dificuldade em convencer os animais a entrarem na arca. Obviamente logo passaram o papel pro Donald, que ficou incumbido de ajudar o patriarca na tarefa.
Eu até hoje não sei se Donald era pra representar um dos filhos de Noé ou se era só pra efeito cômico. Talvez o segundo, porque Donald se perde de Margarida e os dois ficam se desencontrando o tempo todo, até que chega o final e temos aquela catarse deliciosa que nos faz suspirar "oooownn".
...
Eu sou sensível a patos e ratos apaixonados, me deixe.
E porque seria bisonho tentar explicar como animais antropomórficos poderiam ser gerados de humanos, e esse curta já teve percalços demais no quesito "regras de mundo".
Esse é um curta GRANDIOSO. Assim como Pines of Rome, as imagens são epicamente grandiosas, mas não em excesso a ponto de se tornarem monótonas. A música dá espaço pra que cenas engraçadinhas aconteçam, até porque É UM DESENHO DO PATO FREAKIN DONALD. E eles conseguem nos fazer rir, se empolgar, se arrepiar e até se importar com esses personagens.
A idéia veio do Michael Eisner que, provando que tinha tino artístico, contou sobre como foi pra graduação do seu filho e lá tocaram a tradicional música. Ele sugeriu que fizessem um curta com a música, mas que mostrassem outra interpretação que não fosse graduação.
A idéia original de Eisner seria botar os personagens Disney como num evento de graduação ou batismo, contendo as princesas (que na época não tinham um P maiúsculo) com seus filhos para apresentação, e outras gravidas, até que alguém (provavelmente Roy) lembrou que pra fazer filhos, os personagens teriam que ter feito o Devil's Tango e isso não cairia muito bem pra imagem da marca; os animadores também se recusaram a trabalhar nessa idéia.
Outro dos conceitos iniciais era de mostrar as Princesas Disney com seus filhos e os Príncipes com diplomas de graduação, numa cerimônia povoada por todos os personagens animados Disney dos últimos 60 anos. Até chamaram os membros viventes dos Nove Anciões pra reprisar seus personagens.
Os Old Men saíram da sala assim que a apresentação acabou.
Talvez a idéia da Disney adaptar histórias bíblicas não seja bem encarada hoje, por inúmeros motivos. Raios, Jeffrey Katzemberg queria muito fazer um remake de 10 Mandamentos na Casa do Rato, e só conseguiu quando fundou a Dream Works. Mas esse consegue passar por não tentar ser uma adaptação fiel da história original.
E mais: não teve nenhuma morte relacionada à produção desse curta. TOMA ESSA WARNER BROS.!
O último curta é O Pássaro de Fogo, que mostra a... Mãe Natureza? Sprite? É um tipo de fada, mas dá pra interpretar como a Mãe Natureza ou Te-Fiti. Enfim, mostra o duelo entre a sprite e o pássaro de fogo que acorda de um vulcão. É um curta sobre a capacidade de renascer após ou em meio às dificuldades, que é um tema universal.
Animação fantástica, música fantástica, e... É só um curta fantástico.
Não lembro se eu tive o mesmo problema com o primeiro Fantasia, mas são filmes muito difíceis de se escrever sobre. É o tipo de coisa que precisa ser experienciado, tentar dissecar ou analisar é um pouco complicado, até por envolver visão e audição a um nível emocional muito primitivo.
Eu legitimamente gosto mais desse Fantasia que o original. Papo sério. Não é nem pela nostalgia porque, de novo, eu não vi quando moleque, só rastros dele. Eu tenho mais envolvimento emocional com o trailer do que com o filme em si. Mas é simplesmente espetacular, impressionante, e uma celebração da animação e música, uma evolução natural das Silly Symphonies.
Talvez os intervalos com celebridades não agradem a todo mundo, mas é o tipo de coisa necessária num projeto como esse. Em concertos também há essas pausas até pra explicar um pouco da história da música, e aqui eles mostram até um pouco de projetos cancelados de Fantasia, é interessante.
Sim, um dos produtores e consultor musical de Um Maluco no Pedaço e o compositor do tema de Ironside, que foi parodiado no quadro Fucker and Sucker do Casseta e Planeta, que só agora eu descobri que não era a música original mas sim uma paródia. Na minha mente eles usavam o próprio tema de Ironside no quadro.
Aliás, Ironside teve um reboot curto há pouco tempo atrás.
...
Eu sei lá eu descobri isso tudo agora e queria jogar aqui. Cultura inútil sempre é bem-vinda no blog.
Então, sim, eu prefiro Fantasia 2000 do que o original, embora ele esteja um curta mais curto (HAH!). O original tinha umas 2 horas e esse tem a tradicional 1h30, eu acho que poderia ter encaixado mais algum outro curta. Talvez pelo tempo de produção isso fosse impossível, ou pelo tempo ser o ideal pro público de cinema.
Mas eu falo sério quando eu digo: precisamos de mais Fantasias. Disney tá abrindo duas séries de curtas autorais tanto na Disney Animation quanto na Pixar, e vão lançar os curtas no Disney+. Pegasse esse pessoal e mandasse fazer curtas com música clássica e fizesse realmente o lance rotativo de Fantasia. Disney tem grana pra isso, se gasta TANTA grana com remake que ninguém pediu (ao invés de fazer a rota mais barata e segura de relançar os filmes no cinema, como costumava fazer), tem grana pra bancar um Fantasia novo por ano.
Maioria das músicas clássicas já caíram em domínio público há muito tempo, e eles tem os talentos. Seria até um incentivo pra ver Fantasia no cinema, mesmo que lançasse os curtas na internet ou no Disney+ depois, mas que valorizasse a experiência de ouvir um som surround.
Digo, no intervalo antes de Pompa e Circunstância, o Mickey sai corendo pelo estúdio procurando o Donald, que tava atrasado pro curta. O sistema de som fazia parecer que o Mickey tava correndo pelo cinema, e eu pagaria um bom dinheiro por isso.
...não só pelo efeito engraçadinho, mas imagina um som de orquestra acompanhado de curtas dessa magnitude. Imagine!
Enfim, Fantasia 2000 é espetacular, mas assim como o primeiro, não fez tanta grana quanto deveria. Plebeus não apreciam alta arte e provavelmente jogariam grana num remake em "live-CG" de Nem que a Vaca Tussa ao invés de um novo Fantasia.
Also, o fato que o remake de Rei Leão fez MUITO mais grana que o original é um fato que me deixa triste e me lembra que vivemos em um mundo cruel, sanguinário e psicopata.
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Enfim, vamos para tópicos mais alegres. Fantasia 2000 foi o último filme dos anos 90 e também o primeiro filme dos anos 2000, o que nos leva a...
Tigrão - O Filme (The Tigger Movie, 2000)
Como eu provavelmente já devo ter mencionado mas tou sem saco pra ir atrás, Ursinho Pooh foi uma das poucas propriedades Disney que eu cresci vendo. Embora eu não tivesse ido ver o filme do Tigrão, eu tinha o livro que acompanhava CD contando a história (e que tinha a música do Super-Duper-Hiper-Liper Pulo do Tigrão no final), a graphic novel que adaptava o filme pra quadrinhos, e um set de Lego Duplo, embora não fosse específico desse filme.
Enfim, eu não lembro de ter visto esse filme quando moleque, a única memória que eu tenho da história é dos quadrinhos e do livro com áudio. Eu provavelmente devo ter visto uma vez depois dos 10 anos, em algum momento que passou no SBT ou algo assim, porque eu lembrava de alguns versos das músicas, especificamente "Como ser um tigre/como ser um tigre/como ser um tigre é a questão". Eu também lembrava de outro segmento musical que... É, eu já chego lá.
A história pega o mote da música do Tigrão, que termina salientando que ele é o único que existe. Depois dessa epifania, ele resolve ir atrás de sua família. Após ouvir Corujão tagarelar sobre sua árvore genealógica, é exatamente atrás disso que Tigrão vai.
Literalmente. Uma árvore com listras onde um monte de tigrões moram.
Sim, é adorável à beça e tá totalmente dentro do clima das histórias originais.
Guru tenta ajudar Tigrão em sua busca, incentivando-o a escrever uma carta à sua família, mas resulta em nada. Querendo muito animar seu amigo, ele resolve juntar o resto da gangue e escrever uma carta pra Tigrão como se fosse sua família, e o parente distante de Shere Khan e Rajah entende que seus parentes vão aparecer no dia seguinte.
Guru e o resto então decidem se vestir como tigrões e aparecer lá, mas Revelação do Mentiroso acontece, e tudo durante uma tempestade de gelo que abre o inverno.
A história em si é bobinha como os outros filmes, e durante boa parte dele consegue se sustentar. Os personagens agem com o mesmo tipo de inocência (sério, o Tigrão foi atrás de uma LITERAL ÁRVORE CHEIA DE TIGRES) e o guiar da narrativa tenta ser mais confortável e divertido do que uma grande aventura.
E na maior parte do tempo, funciona. Mas lá pra metade do filme eu comecei a estranhar alguma coisa. Alguma coisa não tava batendo bem... Era estranho, e eu ainda não sei exatamente decifrar o que é.
Talvez os diálogos dos personagens que não estivessem no ponto. Diálogos de Pooh são MUITO difíceis de serem escritos, eles tem uma qualidade infantil simples mas confortável e às vezes profunda o suficiente pra adultos. Embora soassem e tivessem várias características dos outros curtas e produções relacionadas aos cenários de brincadeira de Christopher Robin, ao mesmo tempo... soavam falsas.
Talvez pelo clímax do filme. Ursinho Pooh não é um tipo de história grandiosa, mas eles tentam colocar grandes riscos. E pra ser sincero, eles tentaram direito. Não tem um vilão maior e o foco ainda são as relações entre os personagens. É mais um filme de conflitos internos, especialmente o arco de Guru.
O moleque quer ter o Tigrão como um irmão mais velho e procura a todo o tempo a aprovação dele ou imitar o felino. O que é irônico que o Tigrão esteja procurando sua família quando a moral do filme é tão clara e óbvia.
(Na real, uma das coisas que meio que me incomodam é que Tigrão e Can meio que tenham uma insinuação de relacionamento mas ao mesmo tempo meio que não... É meio bizarro e nunca é apropriadamente desenvolvido. Enfim.)
(Na real, uma das coisas que meio que me incomodam é que Tigrão e Can meio que tenham uma insinuação de relacionamento mas ao mesmo tempo meio que não... É meio bizarro e nunca é apropriadamente desenvolvido. Enfim.)
E eles ainda ficam protelando a moral até depois do clímax da avalanche, o que acaba... Talvez seja esse o problema.
Não exatamente em ter um clímax grandioso, foi um experimento do estúdio e uma necessidade financeira. É mais ou menos o que fizeram com Retorno de Mary Poppins e que poderia funcionar aqui, com um pouco de trabalho mental. O problema foi terem tentado fazer disso algo grandioso e com muitos perigos pra botar no trailer.
Mas toda a direção da história a partir da metade, incluindo os diálogos, parecem enfraquecer porque o filme parece perceber que precisa chegar num clímax e final específicos e... Eh.
Poderia ter sido melhor trabalhado com outra direção. Talvez Tigrão explorasse outras opções de busca da sua família, ou reestruturar a história pra que o meio dela tivesse um pouco mais da qualidade quase vinhetesca das histórias originais.
Dá pra contar uma história com um arco narrativo maior e ainda manter esse aspecto de histórias curtas. O desafio talvez seja fazer isso em 1h30 e dentro do universo dos Cem Acres, que parece ter uma ciência roteirística e argumentalística muito específica.
O problema é que o filme falha em tentar ser essa história mais simples e se aproveitar mais da personalidade dos personagens, o que acaba minando o potencial deles mesmo que boa parte das características esteja lá.
No final das contas, é um filme... Passável. A história acaba meio lheguelhé pro final, mas é um filme adorável e inofensivo. Fora que o que eles não acertaram no roteiro, acertaram na direção de arte.
Olha que coisa linda esses cenários, olha os traços nos personagens. São traços meio brutos emulando o estilo xerox dos anos 60, é sensacional demais. E os animadores conseguem dar emoções complexas em rostos tão minimalistas, é espetacular. As cenas engraçadas são engraçadas mesmo em imagens estáticas, é fascinante. Nem parece que foi um estúdio de animação pra TV que fez. Bom, ao menos em parte.
O trabalho de animação foi dividido entre a Disney Toon Studios e a Disney Animation Japan, mas os japoneses fizeram uns 60% do trabalho. E... é sensacional. Um dos melhores trabalhos do estúdio que era acostumado a fazer as séries de TV de Pequena Sereia e Aladdin e outros. Claro, tem os filmes como Corcunda de Notre Dame 2, mas outro dia falaremos dos Direct to Video.
De fato, Tigrão iria ser um filme direto pro VHS, mas Michael Eisner ouviu as músicas dos Irmãos Sherman e decidiu botar na tela grande mesmo. Os Sherman não trabalhavam com a Disney desde Se Minha Cama Voasse, então era uma grande oportunidade.
E... É. Falemos das músicas.
Embora a maioria esteja no mesmo nível das outras de Ursinho Pooh e ainda consigam dar o tom que a história precisava (como um blues melancólico que o Tigrão canta sobre ser sozinho), tem uma música em especial que me deixa incomodado.
Tigrão em um momento começa a imaginar e descrever seus parentes, e temos referências visuais e auditivas de Broadway, quarteto de barbearia, Marilyn Monroe, The Brady Bunch... MAS QUE RAIO
Seria como se em Retorno de Mary Poppins eles soltassem um rap. Exceto que eles fizeram isso mas conseguiram fazer funcionar. Ok, péssimo exemplo. Uh... É tipo no Corcunda de Notre Dame 2 quando a veterinária do Garfield começa a cantar um pop tão meloso que me dá vontade de enfiar uma britadeira nos ouvidos. Parece algo que a Disney costuma fazer nos filmes feitos em linha industrial onde algum executivo obriga a equipe a botar uma música pop da época no meio.
Digo, normalmente botam nos créditos uma versão pop da música-tema cantada por alguém famoso/semi famoso. Por exemplo, Bela e a Fera tem uma versão da Celine Dion; How Far I'll Go tem Alessia Cara; A Whole New World tem Peabo Bryson e Regina Belle, etc. (Also essa última é sensacional)
Mas esses filmes que tentam apelar pro seu público atual enquanto adaptam uma propriedade antiga geralmente tem AQUELA música que destoa do tom geral do filme e que tu nota que tem uma falta de qualidade. Aladdin 2019 tem Speechless, Hermione e Zé Colméia tem Evermore, Return to Neverland tem I'll Try, a já mencionada do Corcunda, por aí vai.
Só que o que Tigrão faz vai além da música, é uma parada extra-sensorial. A música e as imagens e referências destoam TANTO do resto do filme e de todas as outras produções de Winnie the Pooh que faz o Sephirot segurando o livro do ursinho parecer algo completamente natural.
É surreal demais, e eu creio que a intenção era ser um paralelo do Heffalumps and Woozles, mas nesse aí não tinha referências modernas e debativelmente perturbadoras.
Digo, normalmente botam nos créditos uma versão pop da música-tema cantada por alguém famoso/semi famoso. Por exemplo, Bela e a Fera tem uma versão da Celine Dion; How Far I'll Go tem Alessia Cara; A Whole New World tem Peabo Bryson e Regina Belle, etc. (Also essa última é sensacional)
Mas esses filmes que tentam apelar pro seu público atual enquanto adaptam uma propriedade antiga geralmente tem AQUELA música que destoa do tom geral do filme e que tu nota que tem uma falta de qualidade. Aladdin 2019 tem Speechless, Hermione e Zé Colméia tem Evermore, Return to Neverland tem I'll Try, a já mencionada do Corcunda, por aí vai.
Só que o que Tigrão faz vai além da música, é uma parada extra-sensorial. A música e as imagens e referências destoam TANTO do resto do filme e de todas as outras produções de Winnie the Pooh que faz o Sephirot segurando o livro do ursinho parecer algo completamente natural.
É surreal demais, e eu creio que a intenção era ser um paralelo do Heffalumps and Woozles, mas nesse aí não tinha referências modernas e debativelmente perturbadoras.
...a Tigrona Monroe é muito mais perturbadora do que deveria.
Pior que nem é necessariamente um segmento ruim ou mal animado ou deixa de ser divertido, mas é uma evidência de que eles tavam experimentando com esse filme coisas além do que deveriam. Assim como o clímax do filme que acaba atrasando outras partes do filme.
No geral, ainda é um filme bonitinho e que vale a pena ver. Não é espetacular e o ponto alto é o Super Duper Hiper Liper Pulo do Tigrão, porque... motivos.
Eu sei lá, é algo tão infantil mas tão criativo e tão dentro do espírito dos personagens que é adorável.
E trivia aleatória, o trailer original usa um trecho da música Semi-Charmed Life do Third Eye Blind. Ainda bem que só usam os acordes e "do-do-do"s iniciais, porque é uma música sobre metanfetamina.
Eu faria uma piada de Breaking Bad mas eu nunca vi, então vou só passar pro próximo filme.
Missão Marte (Mission to Mars, 2000)
Esse foi o primeiro longa feito baseado em uma atração dos parques. E quando tu pára pra analisar esse conceito na História do estúdio, logo se vê que a Disney tava molhando os pés antes de mergulhar de vez na idéia.
A ride Misson to Mars tem uma longa história que data da abertura da Disneyland em 1955. Originalmente a ride se chamava Rocket to the Moon, mas em 75 refizeram o plot e nome tendo Marte como pano de fundo, por motivos óbvios. Em 1991, a atração fecha na Disneyland; em 93, a versão na Flórida é retrabalhada como Alien Encounter. Rumores que a mesma coisa iria acontecer na Disneyland, e por isso fecharam a ride em 91 pra fazerem reformas. Mas Alien Encounter causou mó polêmica que poderemos ver outro dia.
Ou cê pode ver vídeo de gente mais qualificada que eu tipo o Defunctland, talvez ele ou alguém do tipo tenha um vídeo sobre a ride. Enfim.
Em 98 reformularam o lugar onde antes era a ride pra ser uma pizzaria (Redd Rocketts Pizza Port), e em 2018 foi reformulada de novo pra ser o Pizza Planet, e só de ler o artigo da Disney Wiki me deu vontade de comer pizza nesse lugar.
Então, só pra recapitular: é um filme da Touchstone, não lançado pelo estúdio principal, baseado em uma atração que a essa altura já tinha virado um restaurante, e tinha BRIAN DE PALMA COMO DIRETOR??
Sim, AQUELE Brian de Palma. Scarface, Os Intocáveis, esse mesmo. BRIAN DE PALMA DIRIGIU O PRIMEIRO FILME BASEADO EM UM BRINQUEDO DOS PARQUES DISNEY.
A realidade às vezes me surpreende.
A história conta sobre um grupo de astronautas que começam um trabalho de exploração e implementação de vida em Marte. Eles tão lá, fazem experimentos com uma estufa, etc. Até que eles encontram um rosto gigante em Marte, e quando vão explorar o monumento erigido em homenagem à Candace Flynn, uma tempestade surge e mata os astronautas.
Uma equipe de resgate é organizada pra ao menos tentar descobrir o que raio aconteceu, e eles... uh... Descobrem... e...
...eu sei lá, eu fiquei rindo durante o clímax.
Então... Eu não vi muitos filmes "sérios" sobre exploração espacial. Eu não conheço bem o tipo de narrativa ou os clichês, então talvez seja por isso que eu tenha gostado desse aqui. Ou talvez porque ele tenha idéias simples e previsíveis, mas a forma que o filme faz com que a gente se preocupe com os personagens é incrivelmente funcional.
Quando tu vê... sei lá, Alien ou algum filme do tipo, geralmente o elenco de humanos são simplórios, minimalistas, e basicamente estamos dando uma olhada no buffet da criatura, seja ela um xenomorfo, um zumbi, um maníaco, ou o Leslie Nielsen.
Claro, Mission to Mars não é um filme de terror, mas tem algumas similaridades. Dá pra dizer que o próprio planeta vermelho é o monstro, ou as tempestades de areia.
Claro, Mission to Mars não é um filme de terror, mas tem algumas similaridades. Dá pra dizer que o próprio planeta vermelho é o monstro, ou as tempestades de areia.
Então, é interessante que passemos tempo com os personagens, e aqueles que morrem cedo não desperdiçam nosso tempo. Conhecemos eles por cima, mas eles são mais uma ferramenta narrativa pra conhecermos os que nos acompanharão por maior parte do tempo do filme.
Embora as personalidades deles sejam ligeiramente sufocadas pelas obrigações narrativas.
Eu lembro do Woody que é o maluco genérico de bom coração, a esposa dele Terri que é a mocinha genérica de bom coração, o cara lá de Canguru Jack que é um solteiro mulherengo e piadista, e o cara de CSI Nova York que é o traumatizado por ter perdido a esposa e sente que a missão vai celebrar a memória dela ou algo assim.
E tem o Don Cheadle, que tu deve conhecer de Hotel Ruanda, Hotel Bom pra Cachorro, e a série dos Homens e Seus Segredos.
Ah é, ele fez o Algumacoisa de Combate nuns filme de herói aí.
Eu consigo lembrar e me importar com cada um deles, e em cada momento de suspense eu conseguia realmente sentir a dor e a tensão dos personagens. A gente passa tempo com eles se preparando pra viagem e até se divertindo durante a missão, e tudo colabora pra que a gente se apegue a eles nem que seja um pouco. Também o fato de que esse não é um filme onde todo mundo acaba morrendo, então mortes não são constantes a ponto de nos dessensibilizar e nós ficamos receosos de quem pode ser o próximo, e se a missão vai ser completada.
O filme consegue se demorar em tomadas e cenas longas, construindo a tensão. Então é um filme meio lento, mas nada a nível de 2001, que eu só vi uma vez durante uma aula de IA e eu devo ter cochilado por mais da metade do filme.
Eu gosto de como o filme tenta se levar a sério, tentando ser um sci-fi como qualquer outro e ainda pegando a experiência da ride de alguma forma. A forma que ele é filmado com uma câmera "flutuante" e com trucagens óticas é sensacional, e tá de acordo com o espírito da atração original, embora o plot seja totalmente diferente. Digo, além do fato de ter uma missão... e marte... e alguma coisa interromper a missão...
...ok a partir de agora vai ter spoiler do filme. Eu aviso quando acabar.
Então... O lance que eles encontram em Marte...
...
Ok o rosto lá emite um som bizarro que os astronautas acabam por dissecar. O cara do CSI se lembra que o cara de Canguru Jack fez um DNA de M&M's flutuantes uma vez e nota que os gráficos do som no computador parecem com a estrutura do DNA humano. A pior parte é que ERA REALMENTE ISSO.
Fica pior, tem uma parte faltando do DNA, então eles presumem que seja o mesmo DNA humano e o que eles precisam fazer é emitir um som que complete a cadeia genética. E FUNCIONA. Eu não sei como RAIOS eles conseguiram, mas esse absurdo FUNCIONA.
E FICA PIOR. Eles entram no rosto e descobrem que os humanos vieram de alienígenas que compartilham o mesmo DNA que a gente.
E durante todo esse absurdo eu tava rindo feito uma foca com caganeira.
SÉRIO COMO RAIOS OS CARAS FAZEM UM NEGÓCIO DESSE? Não só é ridiculamente clichê, mas destoa TOTALMENTE do resto do filme. Teria sido muito mais aceitável se fosse algum mumbo jumbo que permitisse os humanos começarem a colonizar Marte depois de alguma catástrofe que botasse a equipe em risco, sei lá. Se bem que eu totalmente não esperava aliens a essa altura, o que pode ser bom por ser imprevisível ou ser ruim por ao mesmo tempo ser previsível e lugar-comum.
Mas mesmo nisso tudo, a fotografia se mantém elegante e a narrativa te mantém investido em descobrir o mistério. Ao menos isso. E sim, a CG ficou bem antiquada, mas tem um charme inconfundível.
Ok, veredito final...? Eh. Vale a pena ver ao menos por motivos históricos, ser o primeiro filme baseado numa ride da Disney. Dá pra ver que deram MUITA liberdade aos produtores, especialmente porque a ride original era bem simples. Não tinha personagens marcantes, ou um plot específico, era mais uma experiência de algo não muito distante de nós. Não é como se fosse um Piratas do Caribe ou Mansão Assombrada, que vão mais pela fantasia e tentam de uma forma ou de outra, contar uma história.
Se gostar do gênero sci-fi, até que vale a pena dar uma olhada. Se não gostar de filme lento, passa longe mesmo.
Also o cara do CSI é que apresenta a Mission Space hoje, com um desinteresse tão grande que ele parece que tá apresentando um trabalho escolar. A miniatura da nave também tá em exposição nessa ride. Ou é em outra, sei lá, eu tou com preguiça de pesquisar agora. Eu fui dormir 5 da manhã, me dêem um desconto.
Ok, Fantasia 2000 terminado, era hora do estúdio ir em frente com os novos projetos e suas invenções. Nos anos 80, Phil Tippet (o cara do stop motion de Star Wars, Willow e Dragonslayer) tinha uma idéia de um filme mais naturalista, dramático, sombrio e violento sobre dinossauros, e até fez um curta em 84 chamado Prehistoric Beast. É um curta monótono, mas visualmente impressionante, especialmente porque o cara gravou na garagem de casa.
Nos anos 90 o projeto foi pra Disney que iria lançar pela divisão de "live-action" (eu imagino que seja a Touchstone, mas nem a Wikipedia nem nenhuma outra fonte que eu procurei menciona isso; ou talvez fosse um live-action a ser distribuído pela Walt Disney Pictures, sei lá), mas o projeto entrou num inferno de desenvolvimento. Os caras queriam que o filme fosse o drama sombrio com ares de documentário, mas a Disney queria um filme fofinho com dinossauros falantes.
Pra terem uma idéia dos rumos do roteiro, o filme focaria num estiracossauro (tipo um tricerátops só que cearense) contra um t-rex. O clímax envolveria uma batalha entre os dois onde o cornossauro venceria o rei dos dinos, mas um meteoro atingiria a terra logo depois.
Porque se tem algo que rima com "Disney", esse algo é "niilismo".
Chegou ao ponto em que eles queriam usar lêmures reais, até que alguém na Disney percebeu que Jurassic Park tava indo bem demais com dinossauros digitais, e resolveram esperar pra que eles tivesse a tecnologia pra fazer o que queriam.
A Disney acabou tendo que comprar um estúdio de efeitos visuais e mesclar com o departamento de CG da Disney Features, criando o mini-departamento conhecido como Secret Lab, que eventualmente só fez Dinossauro e trabalhos aleatórios pra Disney/Touchstone. Ironicamente, o último trabalho deles foi pra um filme da Warner, Canguru Jack.
Enfim, agora tinham a tecnologia e começavam a dar uns tapas no roteiro pra ficar comercialmente viável (tipo tirar referências bíblicas dos personagens principais e dar diálogos pra eles). O problema agora era: o estilo do filme era ousado demais pra época e algo muito diferente do que a Disney fazia.
Eles tinham um grande desafio nas mãos: um filme animado em CG fotorrealista, mas sem perder o carisma dos personagens animados e com uma história épica.
Eles tinham um grande desafio nas mãos: um filme animado em CG fotorrealista, mas sem perder o carisma dos personagens animados e com uma história épica.
E eles conseguiram. Os miseráveis conseguiram.
...de uma certa forma.
Dinossauro (Dinosaur, 2000)
E o que raio tornava Dinossauro tão ambicioso e diferente dos outros longas animados? Bom, não só a história em si lembrava Rei Leão, mas o estúdio parecia querer replicar o mesmo efeito.
Eu ia mandar vocês reverem o vídeo com a abertura do VHS de Toy Story 2, mas por algum motivo o YouTube bloqueou o trailer de Dinossauro. Não, eu não faço idéia do motivo, mas o trailer da época tá aqui. Enfim, sim, são os minutos iniciais, praticamente na íntegra, exatamente como fizeram com Rei Leão. Provavelmente porque o plot em si tem vários pontos muito parecidos com as aventuras do Hamlet furry.
Aladar é um iguanadonte (sei lá se tou escrevendo certo, dane-se) cujo ovo vimos ser transportado pelas paisagens da Europa, Venezuela e Havaí por um pterodáctilo. O ovo cai no meio de uma tribo (?) de lêmures, que receosamente adotam o bichinho, que cresce e vira basicamente o guardião dos lêmures ou algo assim.
Até que chega o dia do acasalamento na ilha, e o lêmure mulherengo que parece o Supla novamente fica sem um par. Talvez se ele passasse menos tempo berrando "VEM PRO PAPITOOOOW" e "EU SOU O PROFESSOR DO AMOR E A AULA COMEÇOU" talvez ele tivesse mais chances.
...oh, sim, os dinossauros falam.
Mas no dia do acasalamento, as coisas ficam mais quentes do que deveriam, depois que um meteoro cai na ilha e os únicos sobreviventes são Aladar e sua família adotiva, que envolve sua mãe, seu avô, Supla e uma lêmure piveta dublada por uma Hayden Panettiere igualmente piveta, dois anos depois de sua estréia como dubladora em Vida de Inseto.
Eles então encontram um bando de sobreviventes de outras raças de dinossauros lideradas por Kron, dublado pelo Sebastião da Pequena Sereia, e fazem amizade com duas dinossauras idosas que são constantemente deixadas pra trás pelo resto do bando. Aladar então luta pra levar o bando pro Vale Encantado ou seja lá como chamaram no filme enquanto fogem do dinossauro mais daora que já existiu: o carnotauro.
Sério vai se lascar é um tiranossauro rex vermelho com escamas que parecem espinho e um par de chifres na cabeça. Eu não ligo que ele era pouco menor que um iguadotone na vida real, esses bichos são DO BALACO BACO.
A idéia original era fazer com que os dinossauros realmente não falassem, que fosse um filme mais dramático e naturalista, e pra tentar diferenciar de Em Busca do Vale Encantado. Eisner foi totalmente contra a idéia, tanto por ser incrivelmente imbecil (eu acho que funcionaria pra um curta, mas teria que ter um roteiro insanamente bom pra isso), como também não seria comercialmente viável. O único resquício disso é realmente a abertura do filme.
Que... é meio que culpado pelo estranhamento das falas no filme. É algo tão sensacional de uma maneira sensorial, que quando os bichos começam a falar causa uma certa estranheza. Claro, depois a gente se acostuma e vemos até a utilidade dos diálogos (mais à frente) que acabamos aceitando. O que não dá pra aceitar é o diálogo do Supla que chega a ser doloroso de tão datado... Mas ao menos não fica por muito tempo e tão rápido quanto aparece, vai embora. Não duvido que tenha sido escrito puramente por motivos comerciais, sei lá. Ao menos não é um personagem que eu me irrite tanto a ponto de querer matar ao final do filme.
Aladar é o cara bonzinho de bom coração genérico, o que automaticamente torna ele "eh". Não odiável por quão clichê é, mas ao menos suportável. Na real, todos os personagens sofrem do mesmo mal, de serem genéricos mas se salvando por pouco. Acho que os únicos personagens que realmente são interessantes e divertidos são as duas velhas e talvez os antagonistas.
Kron é o líder durão e casca-grossa, mas no fundo tem boas intenções e só quer que o bando sobreviva o máximo que pode. O problema maior dele foi o ego inflado e o medo de perder o posto pro novato Aladar. Brutus (ou seja lá como se chame) também segue a mesma linha, mas ainda tem um certo medo pra guiar suas decisões.
E ele tem diálogos e um arco de redenção que carrega toda a moral do filme, sobre escolhas, esperança, e não desistir. Parece clichê, mas é escrito de uma forma que te faz pensar um pouco, ao menos. É passado de uma forma interessante pela mãe adotiva de Aladar, que é outra personagem que eu adoro.
Ela é basicamente a Kala de Tarzan, a mãe loba de Mogli, a princesa egípcia que adota Moisés. Só que ela não tem exatamente um trejeito maternal, ela parece mais aquelas mães solteiras jovens e atrevidas.
Quando ela encontra Aladar e resolve ficar com ele, Yar (que eu presumo que seja o líder do bando de lêmures) é totalmente contra e manda que ela se livre dele antes que ele cresça e mate todo mundo. Ela joga o moleque nos braços do velho e diz "ok mata ele aí". É totalmente diferente de Kala ou da loba, que tem aquele apego e instinto materno de proteger de Kerchak e Shere Khan. Ela ainda tem o apego e instinto materno, mas de uma forma mais bruta.
A própria relação com Aladar tem suas semelhanças com essas histórias, mas com a diferença de sua aceitação no grupo, que é mais rápida. É familiar, mas diferente o suficiente pra que seja algo diferente.
Infelizmente não é o suficiente pra nos dar personagens igualmente memoráveis. Os peronagens principais continuam pouco além do básico em termos de relacionamento, e pode-se argumentar que o romance de Aladar e Neera seja mais motivado pelo instinto animal do que seres humanos mas... Eehhh. Sei lá.
Mas o que realmente nos instiga a continuar vendo o filme são os gráficos digitais. Esse filme é diferente de TUDO que a Disney ou qualquer outro estúdio tenha tentado até então. Era comum ver criaturas digitais em ambientes reais, mas um filme inteiro disso? Era arriscado, a tecnologia ainda não tava no ponto pra criaturas orgânicas, tanto é que até hoje alguns animais do filme soam falsos (especialmente os lêmures), mas coisas como galhos no chão são absurdamente realistas. A menos que sejam galhos reais, sei lá. Mas tem pedra e caverna etc é sensacional.
Mas veja bem: até agora a Disney só produziu animação tradicional, no máximo usando CG quando necessário (seja pra fazer coisas como a Cave of Wonders, storyboard da cena do baile de Bela e a Fera, ou só colorindo as cenas), mas os caras tiveram o trabalho de viajar o mundo gravando cenas reais em florestas e desertos pra depois botar os bichos digitais fotorrealistas.
Os répteis são soberbamente bem-feitos, até pros padrões de hoje. Claro, em close-ups nota-se melhor as falhas, mas pode-se dizer que Dinossauro já tava alguns passos à frente da Pixar na época, onde eles evitavam close-ups como os feitos em Dinossauro, justamente porque sabiam que de perto iam notar as pixelações das texturas. Dinossauro ainda consegue fazer close-ups impressionantes, mas que não envelheceram bem.
Por outro lado, de longe são fantasticamente verossímeis e conseguem passar no teste do tempo. As texturas são realistas e dá pra ver até gotas de água escorrendo entre os sulcos da pele dos personagens. Claro, de todos os ângulos possíveis, os lêmures parecem ter saído diretamente de um daqueles vídeos de demosntração de placa de vídeo dos anos 2000 e pouco, mas a tecnologia pra pêlos não ia ser funcional até Monstros S.A..
Agora, sabe o que é mais triste? Saber que essas criaturas estranhas ainda são melhores do que Rei Leão 2019 e suas expressões de empada mofada. Tanto dinossauros quanto lêmures tem expressões humanizadas sem perder as características dos animais, inclusive a velhinha que parece um tricerátopo mas eu já esqueci o nome do bicho. Ela tem os olhos muito distantes um do outro e uma boca pouco móvel, mas ainda assim é expressiva, é espetacular.
TOMA ESSA REI LEÃO! VOCÊ É UMA VERGONHA PRA HUMANIDADE!
Outro aspecto relevante desse filme e que se tornaria uma trend que perdura até os dias de hoje, são os dubladores famosos. Claro, animações tem feito isso desde... Dama e o Vagabundo, e tem se tornado cada vez mais constantes desde Aladdin com Robin Williams, mas tem ficado mais por lá mesmo, por aqui sempre preferiram usar dubladores profissionais ao invés de celebridades.
Claro, tínhamos alguns nomes como Aloysio de Oliveira em Robin Hood e outros filmes da época, mas no geral chamavam dubladores profissionais. Os casos que me vem à mente agora são Du Moscovis dublando Tarzan adulto e o cara do LS Jack fazendo a voz cantante de Hércules.
Em Dinossauro foi quando começamos a ter uma divulgação maior pra chamar atenção pro filme. Digo, olha esse vídeo do Du Moscovis gravado em uma batata. Era um bônus de um CD-Rom da AOL que vinha com horas de internet, conceito que os mais jovens sequer conseguem conceber.
Olha que parada feita de qualquer jeito, sem cuidado. Os vídeos da infância do YouTube tinham mais qualidade que isso, fora o trabalho de edição que é praticamente nulo. Agora olha o de Dinossauro, como é bem-acabado e feito pra ser visto até na TV se precisar. Tem poster do filme e mostra o pessoal dublando etc.
E não só isso, mas o elenco de famosos é bem maior: Fábio Assunção, Malu Mader, e a melhor parte da dublagem que é Hebe Camargo e Nair Belo. Sério, elas duas fazendo dinossauras idosas é a melhor piada de casting que só não foi superada pelo Luciano Huck em Enrolados porque a leitura dele das falas é tão ruim que me dá vontade de me enrolar em papel alumínio e entrar num microondas.
Ao menos aqui o pessoal sabe atuar, e pelo que eu me lembro, o único momento que quebra tua percepção de que são celebridades dublando é no final quando a braquiossaura vê o filho de Aladar e diz "gracinha". E isso é um feito e tanto. Raios, eu só fui descobrir agora que o Du Moscovis tinha dublado o Tarzan, eu tou acosutmado com o Guilherme Briggs no desenho que passava no Bom Dia e Cia e achei que ele tinha dublado no filme também.
Enfim, a tradição persiste até hoje porque os estúdios sabem que atrelar o filme a um nome famoso é garantia que ao menos o pessoal vai ver porcausa do famoso, mesmo que ele não saiba atuar ou tenha uma personalidade automaticamente irritante tipo o Olaf do Porchat.
Boa parte do meu ódio vem da dublagem brasileira de Frozen. Sério, a voz da Elsa é MUITO velha pra ela.
Dinossauro envelheceu surpreendentemente bem em algumas partes, mas o que envelheceu mal ficou REALMENTE mal. Mas é altamente experimental, parece algo que a Disney faria mas lançaria pela Touchstone, sei lá. De fato, na Suécia, Dinamarca e Reino Unido, o filme nem consta no canon animado Disney, sendo substituído por Selvagem pra manter o mesmo número oficial. O que é meio bizarro, na real.
Os personagens são básicos e clichês, mas nenhum detestável. O que realmente te faz gostar do filme são os visuais, e eles são ou surpreendentemente bons e tecnologicamente criativos (os caras até usaram pirotecnia e maquetes nos meteoros), ou risivelmente datados, assim como uma ou outra fala.
Dinossauro é uma pérola subestimada Disney, mas poderia ter sido bem melhor.
E esse filme iria ditar o curso criativo da próxima Era, enquanto Eisner se metia em mais trapalhadas corporativas.
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2 comments
+Kapan, gostei muito desse artigo!
ResponderExcluirSe me lembro bem, tinha o vhs de Fantasia 2000, Tigrão: O Filme e Dinossauro (o filme Missão Marte não assisti, tão pouco possuí o vhs).
No caso dos filmes Tigrão: O Filme e Tarzan, lembro que tinha o livro com o cd que contava a história (talvez tivesse de outros filmes só que não lembro)!
Seria interessante uma resenha de dois filmes do Disney Channel:
A Casa Inteligente-1999 (Smart House) (afinal de contas, com o avanço da automação doméstica, seria um filme interessante para abordar nesse tópico), fora que assisti uma vez na Sessão da Tarde;
A Filha do Presidente-1998 (My Date with the President's Daughter) (talvez um dos filmes que tenha começado a tendência de se produzir filmes com essa temática no final dos anos 1990 e começo dos anos 2000, seguindo o que se dizia da família dos presidentes Bill Clinton e George W. Bush), e lembro também que assisti esse filme na Sessão da Tarde. *
*Teria sido uma ideia muito esperta fazer um crossover do conceito do filme acima na série spin-off do Cory na Casa Branca, já aproveitando para fazer uma reunião de elenco do filme!
No mais, agradeço a atenção e aguardo resposta!
Casa Inteligente se tiver no Disney+, capaz de eu comentar em podcast. (No próximo, porque já tenho planos com outro filme)
ExcluirA Filha do Presidente e H-E Double Hockey Sticks eu quero muito ver, mas mais porque tem o Eric e o Jack de Boy Meets World ahueahuea